TURISMO, DIREITO
E TRANSFORMAÇÃO
Análise estratégica das intersecções entre turismo, direito e transformação institucional, com foco em modelos regulatórios, inovação territorial e diplomacia cultural em contextos de transição.
Introdução Geral
1. Apresentação
do Tema
O
turismo, enquanto fenómeno económico, social e cultural, tem vindo a assumir um
papel cada vez mais central na sociedade contemporânea. Em Portugal, país de
reconhecida vocação turística, esta actividade representa uma das principais
fontes de receita, emprego e investimento, influenciando directamente o
ordenamento do território, a protecção ambiental, a mobilidade, e até mesmo a
identidade nacional. Contudo, para além da sua dimensão prática, o turismo é
também um objecto jurídico complexo, que exige uma abordagem sistemática e
interdisciplinar.
O Direito do Turismo emerge como ramo autónomo, ainda em consolidação, que congrega normas de diversas áreas desde o direito administrativo ao direito do consumo, passando pelo direito fiscal, laboral, ambiental e internacional. Esta pluralidade normativa reflecte a transversalidade do sector turístico e a necessidade de uma regulação eficaz, capaz de proteger os interesses dos turistas, garantir a qualidade dos serviços e promover um desenvolvimento sustentável.
Este
livro propõe-se a estudar o Direito do Turismo em Portugal de forma abrangente,
crítica e actualizada, oferecendo ao leitor uma ferramenta de análise jurídica
que vá além da mera compilação legislativa, integrando jurisprudência, doutrina
e tendências emergentes.
2. Justificação
da Relevância Jurídica do Turismo
A
relevância jurídica do turismo decorre, em primeiro lugar, da sua importância
económica. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) e do
Turismo de Portugal, o setor representa cerca de 8% do Produto Interno Bruto
(PIB) nacional, sendo responsável por milhares de postos de trabalho directos e
indirectos. Esta magnitude exige uma estrutura legal robusta, que assegure a
previsibilidade, a segurança jurídica e a protecção dos diversos
intervenientes.
Em
segundo lugar, o turismo envolve uma multiplicidade de relações jurídicas como contratos
de alojamento, pacotes turísticos, transporte, seguros, responsabilidade civil,
entre outros. A ausência de uma abordagem jurídica integrada pode gerar
lacunas, conflitos normativos e insegurança para os operadores e consumidores.
Além
disso, o turismo levanta questões jurídicas sensíveis, como a protecção de
dados pessoais em plataformas digitais, o impacto ambiental de empreendimentos
turísticos, os direitos dos trabalhadores sazonais, e os desafios da
fiscalidade no sector. A regulação destas matérias exige uma leitura crítica e actualizada
do ordenamento jurídico português e europeu.
Por
fim, a crescente internacionalização do turismo, com turistas oriundos de
diferentes jurisdições e operadores multinacionais, impõe uma articulação entre
o direito interno e os instrumentos internacionais, como as directivas da União
Europeia (UE), os tratados bilaterais e os regulamentos da Organização Mundial
do Turismo (OMT).
3. Metodologia
e Objectivos
A
metodologia adoptada neste estudo é essencialmente jurídico-dogmática, com
recurso à análise sistemática da legislação nacional e europeia, da
jurisprudência relevante e da doutrina especializada. Complementarmente, serão
utilizados elementos de natureza empírica e estatística, sempre que contribuam
para a compreensão do contexto regulatório.
Os
principais objectivos deste livro são:
·
Identificar
e sistematizar as normas jurídicas aplicáveis ao sector do turismo em Portugal;
·
Analisar
criticamente os regimes jurídicos específicos, como os empreendimentos
turísticos, os contratos turísticos, a protecção do consumidor e a
sustentabilidade ambiental;
·
Estudar
a articulação entre o direito nacional e os instrumentos internacionais e
europeus;
·
Apresentar
casos práticos e jurisprudência relevante que ilustrem os desafios jurídicos do
sector;
·
Propor
caminhos de reforma legislativa e boas práticas regulatórias.
Este
trabalho dirige-se a estudantes de direito, profissionais do sector turístico,
juristas, decisores políticos e investigadores interessados na intersecção
entre turismo e direito.
4. Delimitação
do Objecto de Estudo
O objecto
de estudo deste livro é o Direito do Turismo em Portugal,
entendido como o conjunto de normas jurídicas que regulam a actividade
turística, os seus agentes, os consumidores e os impactos sociais, económicos e
ambientais do mesmo. A abordagem será centrada no ordenamento jurídico
português, com incursões no direito europeu e internacional sempre que
pertinentes.
Não se
pretende esgotar todas as dimensões do turismo, mas sim focar nas questões
jurídicas mais relevantes e actuais, nomeadamente:
·
O
regime jurídico dos empreendimentos turísticos;
·
Os
contratos turísticos e os direitos dos consumidores;
·
A protecção
ambiental e o ordenamento do território;
·
A
fiscalidade e o regime laboral no sector;
·
A
digitalização do turismo e a protecção de dados;
·
A
jurisprudência e os desafios regulatórios emergentes.
Serão
excluídas, por razões de delimitação temática, as abordagens puramente
económicas, sociológicas ou históricas do turismo, salvo quando contribuam para
o enquadramento jurídico.
Capítulo I
Conceito e Evolução do Turismo
1.1. O Conceito
de Turismo: Perspectiva Jurídica e Multidisciplinar
O
termo “turismo” tem origem no francês tour, que remete para o ato de
viajar com regresso ao ponto de partida. No plano jurídico, o conceito de
turismo não se encontra plenamente consolidado, sendo frequentemente definido
por exclusão ou por referência aos seus elementos constitutivos: deslocação
voluntária, temporária, não remunerada no destino, com fins de lazer, cultura,
saúde ou negócios.
A OMT
define turismo como “as actividades que as pessoas realizam durante as suas
viagens e estadias em lugares fora do seu ambiente habitual por um período
inferior a um ano, com fins de lazer, negócios ou outros”. Esta definição tem
sido acolhida por diversos ordenamentos jurídicos, incluindo o português,
embora com nuances próprias.
Do
ponto de vista jurídico, o turismo é um fenómeno transversal que envolve
múltiplas áreas do direito:
·
Direito Administrativo: regulação de empreendimentos turísticos, licenciamento e fiscalização;
·
Direito Civil e Comercial: contratos de viagem, responsabilidade civil e seguros;
·
Direito do Consumo: protecção do turista enquanto consumidor;
·
Direito Fiscal:
tributação de serviços turísticos;
·
Direito Laboral:
regimes específicos de trabalho no sector;
·
Direito Ambiental: impacto ecológico e ordenamento do território;
·
Direito Internacional e Europeu: livre circulação, harmonização normativa e protecção
transfronteiriça.
A
complexidade do conceito jurídico de turismo exige, portanto, uma abordagem
interdisciplinar, que articule os princípios jurídicos com os contributos da
economia, sociologia, geografia e gestão.
1.2. Evolução
Histórica do Turismo em Portugal
A
história do turismo em Portugal acompanha, em larga medida, os grandes
movimentos sociais e económicos da Europa. No século XIX, o turismo era uma actividade
elitista, associada às termas e estâncias balneares, como as Caldas da Rainha
ou o Estoril. A criação das primeiras infra-estruturas ferroviárias e
hoteleiras marcou o início da institucionalização do sector.
Durante
o Estado Novo, o turismo foi promovido como instrumento de propaganda nacional,
com forte controlo estatal e enfoque na tradição e na ruralidade. A criação da Direcção-geral
dos Serviços de Turismo (1940) e do Fundo de Turismo (1959) são marcos
relevantes desta fase.
Com a
Revolução de Abril de 1974, o sector sofreu uma reconfiguração profunda,
marcada pela liberalização da economia, pela abertura ao investimento
estrangeiro e pela democratização do acesso ao lazer. A Constituição da
República Portuguesa (1976) consagra, no seu artigo 66.º, o direito ao ambiente
e à qualidade de vida, influenciando directamente o ordenamento turístico.
A
adesão à Comunidade Europeia (1986) trouxe uma nova dinâmica regulatória, com a
harmonização de normas, a liberalização dos transportes e o financiamento de infra-estruturas
turísticas. O turismo passou a ser encarado como vector estratégico de
desenvolvimento regional e coesão territorial.
Nas
últimas décadas, Portugal consolidou-se como destino turístico global, com
reconhecimento internacional em áreas como o turismo cultural, enogastronómico,
de natureza e urbano. A criação do Turismo de Portugal, I.P. (2003) e
a aprovação de regimes jurídicos específicos, como o Regime Jurídico dos
Empreendimentos Turísticos (RJET), reflectem esta evolução normativa.
1.3. O Turismo
como Fenómeno Jurídico Contemporâneo
Na actualidade,
o turismo é reconhecido como um fenómeno jurídico complexo, que exige uma
regulação integrada e adaptada às novas realidades.
Entre
os desafios contemporâneos destacam-se:
·
Digitalização:
plataformas de reservas, turismo virtual e proteção de dados;
·
Sustentabilidade: impacto ambiental, turismo responsável e certificações ecológicas;
·
Mobilidade internacional: vistos, seguros e direitos dos turistas estrangeiros;
·
Crises globais:
pandemia, alterações climáticas e instabilidade geopolítica.
O
legislador português tem procurado responder a estas exigências com
instrumentos normativos específicos, como o Decreto-Lei n.º 80/2015 (RJUE), o
Decreto-Lei n.º 186/2015 (RJET), e a transposição da Directiva (UE) 2015/2302
sobre viagens organizadas.
A
jurisprudência também tem desempenhado um papel relevante na consolidação do
Direito do Turismo, nomeadamente em matérias como responsabilidade civil por
cancelamento de viagens, cláusulas abusivas em contratos turísticos, e proteção
dos direitos dos consumidores.
Neste
contexto, o Direito do Turismo afirma-se como ramo jurídico em expansão, com
autonomia científica e relevância prática, exigindo uma abordagem crítica,
sistemática e actualizada.
Bibliografia:
· CUNHA, L. (2006). Turismo: Princípios, Conceitos e Práticas. Lisboa: Editorial Verbo.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
· COELHO, M. (2015). História do Turismo em Portugal. Lisboa: Edições Colibri.
· Organização Mundial do Turismo (OMT). Glossário de Termos Turísticos.
· MIRANDA, J. (2020). Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Almedina.
· LEAL, J. (2018). Direito da União Europeia. Lisboa: Quid Juris.
·
Decreto-Lei
n.º 80/2015, de 14 de Maio (RJUE).
·
Decreto-Lei
n.º 186/2015, de 3 de Setembro (RJET).
·
Diretiva
(UE) 2015/2302, do Parlamento Europeu e do Conselho.
Capítulo 2
Fontes do Direito do Turismo
2.1. Introdução
às Fontes Jurídicas
O
Direito do Turismo, enquanto ramo jurídico em consolidação, não possui um
código próprio ou um corpo normativo unificado. Pelo contrário, caracteriza-se
pela dispersão legislativa e pela transversalidade temática, o que exige uma
análise sistemática das suas fontes formais. Estas fontes incluem normas
constitucionais, legislação ordinária, regulamentos administrativos,
jurisprudência, doutrina, bem como instrumentos internacionais e europeus.
A
compreensão das fontes do Direito do Turismo é essencial para garantir a
segurança jurídica, a coerência normativa e a protecção eficaz dos direitos dos
diversos intervenientes como turistas, operadores, entidades públicas e
comunidades locais.
2.2.
Constituição da República Portuguesa
A
Constituição da República Portuguesa (CRP) constitui a fonte suprema do
ordenamento jurídico nacional, estabelecendo os princípios fundamentais que
orientam a actividade turística.
Destacam-se, neste contexto:
·
Artigo 66.º – Ambiente e qualidade de vida: consagra o direito ao ambiente e impõe ao Estado
o dever de promover o ordenamento do território e o desenvolvimento
sustentável, com impacto directo na regulação dos empreendimentos turísticos.
·
Artigo 59.º – Direitos dos trabalhadores: aplica-se aos profissionais do sector turístico,
assegurando condições dignas de trabalho, protecção social e formação.
·
Artigo 60.º – Direitos dos consumidores: garante a protecção dos turistas enquanto
consumidores, incluindo o direito à informação, à segurança e à reparação de
danos.
A
Constituição também estabelece os princípios da legalidade, da igualdade, da
proporcionalidade e da participação, que devem orientar toda a actuação
administrativa e legislativa no domínio do turismo.
2.3. Legislação
Ordinária e Regulamentar
A
legislação ordinária constitui o núcleo operativo do Direito do Turismo,
regulando de forma específica os diversos aspectos da actividade turística.
Entre
os diplomas mais relevantes destacam-se:
·
Decreto-Lei n.º 186/2015, de 3 de Setembro – Regime Jurídico dos Empreendimentos
Turísticos (RJET): define os tipos de empreendimentos, os requisitos de
instalação, funcionamento e classificação.
·
Decreto-Lei n.º 17/2018, de 8 de Março – Transposição da Directiva (UE) 2015/2302:
regula os contratos de viagens organizadas e serviços conexos.
·
Lei n.º 24/96, de 31 de Julho – Lei de Defesa do Consumidor: aplicável
aos turistas enquanto consumidores de serviços turísticos.
·
Decreto-Lei n.º 61/2021, de 24 de Julho – Regime da Classificação de Alojamento Local:
regula o registo, funcionamento e fiscalização do alojamento local.
Além
destes, existem regulamentos administrativos emitidos por entidades como o
Turismo de Portugal, I.P., que estabelecem normas técnicas, procedimentos de
licenciamento e critérios de qualidade.
2.4.
Jurisprudência
A
jurisprudência, embora não constitua fonte formal vinculativa no sistema
jurídico português, desempenha um papel relevante na interpretação e aplicação
das normas turísticas. Os tribunais administrativos e comuns têm vindo a
consolidar entendimentos sobre:
·
Responsabilidade
civil por cancelamento de viagens;
·
Cláusulas
abusivas em contratos turísticos;
· Fiscalização de empreendimentos turísticos;
·
Protecção
dos direitos dos consumidores em litígios transfronteiriços.
A
análise jurisprudencial permite identificar lacunas legislativas, orientar a
atuação dos operadores e promover a uniformização da prática judicial.
2.5. Doutrina
A
doutrina jurídica, produzida por académicos e especialistas, contribui para a
sistematização e aprofundamento do Direito do Turismo. Embora ainda escassa em
Portugal, tem vindo a crescer com obras dedicadas ao tema, artigos científicos
e teses universitárias.
A
doutrina é particularmente útil na interpretação de conceitos indeterminados,
na articulação entre regimes jurídicos e na proposta de reformas legislativas.
É também uma ferramenta pedagógica essencial para a formação de juristas e
profissionais do setor.
2.6. Direito
Internacional e Europeu
O
turismo é, por natureza, uma actividade transnacional, o que exige a
consideração de fontes internacionais e europeias.
Destacam-se:
a)
Direito Internacional
·
Convenção de Montreal (1999) – sobre transporte aéreo internacional;
·
Convenção sobre Diversidade Biológica (1992) – relevante para o turismo sustentável;
·
Instrumentos da OMT – recomendações, códigos de ética e estatísticas.
b) Direito da União Europeia
·
Directiva (UE) 2015/2302 – sobre viagens organizadas e serviços conexos;
·
Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD) – protecção de dados pessoais em plataformas
turísticas;
·
Regulamento (CE) n.º 261/2004 – direitos dos passageiros em transporte aéreo;
·
Política de coesão e fundos estruturais – financiamento de infraestruturas turísticas.
A
integração europeia tem promovido a harmonização normativa, a proteção dos
consumidores e a livre circulação de serviços turísticos, influenciando
diretamente o ordenamento jurídico português.
Bibliografia:
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
· MIRANDA, J. (2020). Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Almedina.
· LEAL, J. (2018). Direito da União Europeia. Lisboa: Quid Juris.
· BARROS, M. (2017). Direito do Consumo. Lisboa: Quid Juris.
·
Organização
Mundial do Turismo (OMT). Código Global de Ética para o Turismo.
·
Decreto-Lei
n.º 186/2015, de 3 de setembro (RJET).
·
Diretiva
(UE) 2015/2302, do Parlamento Europeu e do Conselho.
· Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD).
· Convenção de Montreal (1999).
Capítulo 3
Estrutura Administrativa do Turismo
3.1. Introdução
à Administração Turística
A
administração pública do turismo em Portugal é composta por um conjunto de
entidades e organismos que actuam a nível nacional, regional e local, com
competências distintas mas complementares. Esta estrutura visa assegurar a
coordenação estratégica do sector, a promoção da oferta turística, o
licenciamento de actividades, a fiscalização dos operadores e a implementação
de políticas públicas.
A
complexidade e transversalidade do turismo exigem uma administração
especializada, capaz de articular interesses económicos, sociais, ambientais e
culturais, garantindo simultaneamente a competitividade do destino e a protecção
dos direitos dos turistas.
3.2. Turismo de
Portugal, I.P.
O Turismo
de Portugal, I.P. é o organismo público central responsável pela
promoção, desenvolvimento e sustentabilidade do turismo em Portugal. Criado
pelo Decreto-Lei n.º 67/2008, de 10 de Abril, resulta da fusão de várias
entidades, incluindo o ICEP e a Direcção-geral do Turismo.
Principais atribuições:
·
Promoção
internacional da marca Portugal;
·
Apoio
à qualificação da oferta turística;
·
Gestão
de programas de financiamento e incentivos;
·
Licenciamento
e registo de empreendimentos turísticos;
·
Formação
profissional através das Escolas de Hotelaria e Turismo;
·
Produção
de estatísticas e estudos de mercado.
O
Turismo de Portugal actua como interface entre o Estado, os operadores privados
e os organismos internacionais, sendo também responsável pela aplicação de
fundos europeus no setor.
3.3. Direcções
Regionais de Cultura e Turismo
A
nível regional, existem Direcções Regionais de Cultura e Turismo,
integradas nas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), que
têm competências em matéria de ordenamento do território, valorização do
património cultural e promoção turística regional.
Estas
entidades colaboram com os municípios e com o Turismo de Portugal na definição
de estratégias regionais, na valorização de produtos turísticos locais e na
articulação com os planos de desenvolvimento regional.
3.4. Municípios
e Entidades Intermunicipais
Os municípios
desempenham um papel fundamental na administração do turismo, especialmente no
que respeita ao ordenamento urbano, à gestão de equipamentos turísticos, à
promoção de eventos e à regulação do alojamento local.
Algumas
câmaras municipais criaram gabinetes de turismo ou empresas
municipais dedicadas à promoção turística, à gestão do património e à
dinamização cultural. As entidades intermunicipais, como as
Comunidades Intermunicipais (CIM), têm vindo a assumir competências em matéria
de turismo regional, através de planos estratégicos e projectos conjuntos.
3.5. Entidades
de Turismo Regional
As Entidades
Regionais de Turismo são pessoas colectivas de direito público, com
autonomia administrativa e financeira, criadas para promover o desenvolvimento
turístico das respetivas regiões. Estão previstas no Decreto-Lei n.º 61/2021,
de 24 de Julho, e incluem:
·
Turismo
do Porto e Norte;
·
Turismo
do Centro;
·
Turismo
do Alentejo e Ribatejo;
· Turismo do Algarve;
· Turismo da Madeira;
· Turismo dos Açores.
Estas
entidades têm como missão a promoção turística regional, a articulação com os
operadores locais, a gestão de produtos turísticos e a representação
institucional junto do Turismo de Portugal.
3.6. Entidades
Fiscalizadoras e Reguladoras
A
fiscalização e regulação do sector turístico são asseguradas por diversas
entidades, nomeadamente:
·
ASAE – Autoridade de Segurança Alimentar e Económica: fiscaliza as condições de higiene,
segurança e licenciamento dos estabelecimentos turísticos.
·
Inspecção-geral das Actividades Económicas (IGAE): actua em casos de infrações económicas e
comerciais.
·
Tribunais Administrativos e Fiscais: apreciam litígios relacionados com licenciamento,
classificação e contencioso administrativo.
·
Entidades reguladoras sectoriais: como o Instituto da Mobilidade e dos Transportes
(IMT), no caso do transporte turístico.
Estas
entidades garantem o cumprimento da legislação aplicável, a protecção dos consumidores
e a qualidade dos serviços turísticos.
3.7.
Articulação Institucional e Desafios Administrativos
A
articulação entre os diversos níveis da administração turística é essencial
para evitar duplicações, promover a eficiência e assegurar uma visão integrada
do território.
No
entanto, persistem desafios como:
· Fragmentação de competências;
·
Falta
de interoperabilidade entre sistemas de informação;
·
Dificuldades
na fiscalização do alojamento informal;
·
Necessidade
de maior coordenação entre políticas públicas (ambiente, cultura e
transportes).
A
reforma da administração turística deve passar por uma maior descentralização,
pela digitalização dos processos e pela capacitação técnica dos agentes
públicos.
Bibliografia:
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
· DIAS, C. (2019). Administração Pública e Turismo. Porto: Vida Económica.
·
Decreto-Lei
n.º 67/2008, de 10 de Abril - Criação do Turismo de Portugal, I.P.
·
Decreto-Lei
n.º 61/2021, de 24 de Julho - Regime das Entidades Regionais de Turismo.
·
Lei
n.º 75/2013, de 12 de Setembro - Regime jurídico das autarquias locais.
·
Relatórios
do Turismo de Portugal, I.P.
·
Relatórios
da ASAE e da IGAE sobre fiscalização turística.
Capítulo 4
Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos
4.1.
Introdução: A importância da regulação dos empreendimentos turísticos
Os
empreendimentos turísticos constituem a infra-estrutura física e funcional que
sustenta a actividade turística. A sua regulação jurídica é essencial para
garantir padrões mínimos de qualidade, segurança, acessibilidade e
sustentabilidade, bem como para assegurar a protecção dos interesses dos
consumidores e das comunidades locais.
Em
Portugal, o regime jurídico aplicável aos empreendimentos turísticos
encontra-se consagrado no Decreto-Lei n.º 80/2017, de 30 de Junho,
que revogou e actualizou o anterior Decreto-Lei n.º 39/2008,
de 7 de Março. Este diploma estabelece as condições de instalação,
classificação, funcionamento e fiscalização dos empreendimentos turísticos,
articulando-se com o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) e com
normas ambientais, fiscais e laborais.
4.2.
Tipologia dos Empreendimentos Turísticos
O
artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 80/2017 define as principais tipologias de
empreendimentos turísticos, que incluem:
·
Estabelecimentos hoteleiros: hotéis, hotéis-apartamentos e pousadas;
·
Alojamento local: moradias, apartamentos, quartos (regulado autonomamente pelo Decreto-Lei
n.º 128/2014);
·
Aldeamentos turísticos: conjuntos de unidades autónomas com serviços comuns;
·
Apartamentos turísticos: unidades de alojamento integradas em edifícios;
·
Empreendimentos de turismo de natureza: localizados em áreas rurais ou protegidas;
·
Parques de campismo e caravanismo: espaços destinados a estadias ao ar livre.
Cada
tipologia obedece a requisitos específicos de instalação, classificação e
funcionamento, definidos por portarias complementares e regulamentos técnicos.
4.3.
Licenciamento e Autorização de Funcionamento
A
instalação de um empreendimento turístico está sujeita a licenciamento
municipal, nos termos do RJUE, e ao registo junto do Turismo de Portugal, I.P.
O
processo inclui:
·
Pedido
de informação prévia (facultativo);
· Licenciamento urbanístico e ambiental;
·
Comunicação
prévia de abertura ao Turismo de Portugal;
·
Inscrição
no Registo Nacional de Empreendimentos Turísticos (RNET).
A
autorização de funcionamento depende da verificação dos requisitos legais,
incluindo acessibilidade, segurança contra incêndios, higiene, e cumprimento
das normas de classificação.
O
regime privilegia a desmaterialização e simplificação administrativa,
com recurso ao Balcão do Empreendedor e à plataforma RNET.
4.4.
Classificação e Reclassificação
Os
empreendimentos turísticos são classificados por estrelas (1 a 5), de acordo
com critérios objectivos definidos pela Portaria n.º 327/2008,
de 28 de Abril, e actualizações posteriores.
Os critérios incluem:
·
Dimensão
e equipamento dos quartos;
·
Serviços
disponíveis (recepção, limpeza e alimentação);
·
Instalações
comuns (piscinas, ginásios e salas de conferência);
· Acessibilidade e sustentabilidade ambiental.
A
classificação é atribuída pelo Turismo de Portugal, mediante requerimento do
promotor, podendo ser revista em caso de alteração das condições ou por
iniciativa da entidade fiscalizadora.
4.5.
Fiscalização e Sanções
A
fiscalização dos empreendimentos turísticos é da competência da ASAE,
dos municípios e do Turismo de Portugal, I.P.
As infracções
podem ser punidas com:
·
Coimas
(até €35.000 para pessoas colectivas);
·
Sanções
acessórias (encerramento, perda de benefícios fiscais);
·
Responsabilidade
civil e penal por danos causados a consumidores ou ao ambiente.
O
regime sancionatório encontra-se previsto no capítulo VII do Decreto-Lei n.º
80/2017, e é complementado por normas do Código do Procedimento Administrativo
e do Regime Geral das Contra-ordenações.
4.6.
Responsabilidade Civil e Seguros
Os
empreendimentos turísticos estão sujeitos a responsabilidade civil objectiva,
nos termos do Código Civil e da legislação especial, por danos causados aos
hóspedes, visitantes ou terceiros.
São
obrigados a contratar seguros que cubram:
· Acidentes pessoais;
· Danos materiais;
· Responsabilidade ambiental (quando aplicável).
A
jurisprudência tem reconhecido a responsabilidade dos empreendimentos por
furtos, acidentes em piscinas, intoxicações alimentares e incumprimento
contratual.
4.7.
Sustentabilidade e Ordenamento do Território
A
instalação de empreendimentos turísticos deve respeitar os instrumentos de
gestão territorial (PDM, PROT, REN, RAN) e os princípios da sustentabilidade
ambiental.
O
licenciamento está sujeito a:
·
Avaliação
de impacto ambiental (quando aplicável);
·
Compatibilidade
com áreas protegidas e zonas costeiras;
·
Normas
de eficiência energética e gestão de resíduos.
O
turismo sustentável é incentivado através de programas como o REVIVE,
que promove a reabilitação de património público para fins turísticos, e de
certificações ecológicas como o Green Key.
Bibliografia:
· SANTOS, R. (2021). Direito Imobiliário Turístico. Lisboa: Almedina.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Decreto-Lei
n.º 80/2017, de 30 de Junho (RJET).
·
Decreto-Lei
n.º 128/2014, de 29 de Agosto (Alojamento Local).
·
Portaria
n.º 327/2008, de 28 de Abril (Classificação hoteleira).
·
Lei
n.º 50/2018, de 16 de Agosto (Descentralização de competências).
·
Código
Civil Português - artigos sobre responsabilidade civil.
·
Jurisprudência
dos Tribunais Administrativos e Cíveis sobre responsabilidade em turismo.
Capítulo 5
Contratos no Turismo
5.1.
Introdução: A centralidade dos contratos na actividade turística
A actividade
turística assenta, em larga medida, na celebração de contratos entre os
diversos intervenientes: turistas, operadores, agências de viagens, empresas de
transporte, estabelecimentos hoteleiros, entre outros. Estes contratos regulam
direitos e obrigações, definem os serviços prestados e constituem a base
jurídica para a resolução de litígios.
A
especificidade dos contratos turísticos reside na sua natureza complexa, muitas
vezes plurilateral, envolvendo múltiplas prestações e sujeitos. Além disso, são
frequentemente celebrados à distância, com cláusulas padrão e em contexto de
assimetria informativa, o que exige especial atenção à protecção do consumidor.
5.2.
Contrato de Viagem Organizada
O
contrato de viagem organizada é regulado pelo Decreto-Lei n.º 17/2018,
que transpõe a Directiva (UE) 2015/2302. Este contrato envolve
a combinação de, pelo menos, dois serviços turísticos (transporte, alojamento, actividades)
vendidos como pacote por um preço global.
a) Elementos essenciais
· Identificação dos serviços incluídos;
·
Preço
total e condições de pagamento;
·
Direitos
de cancelamento e reembolso;
·
Responsabilidade
do organizador e do retalhista;
· Informação pré-contratual obrigatória.
b) Protecção do consumidor
O
diploma consagra um regime robusto de protecção, incluindo:
·
Direito
à resolução do contrato sem penalização em caso de circunstâncias excepcionais;
·
Garantia
de repatriamento em caso de insolvência do operador;
·
Responsabilidade
solidária do organizador pelos serviços prestados por terceiros.
c)
Jurisprudência relevante
Os
tribunais portugueses têm reconhecido o direito ao reembolso integral em casos
de cancelamento por força maior (ex. pandemia), bem como a responsabilidade por
falhas na prestação dos serviços contratados.
5.3.
Contrato de Alojamento Turístico
O
contrato de alojamento turístico é regulado pelo Código Civil
(contrato de hospedagem) e por legislação especial, como o Decreto-Lei
n.º 128/2014, relativo ao alojamento local.
a) Características jurídicas
· Contrato bilateral e oneroso;
·
Prestação
de alojamento temporário mediante pagamento;
·
Pode
incluir serviços complementares (pequeno-almoço, limpeza, recepção).
b) Obrigações das partes
·
Do prestador:
garantir condições de segurança, higiene, acessibilidade e cumprimento da
classificação atribuída;
·
Do hóspede:
pagar o preço acordado, respeitar o regulamento interno, não causar danos.
c) Questões práticas
· Cancelamento e reembolso;
· Overbooking e realojamento;
·
Responsabilidade
por furtos ou acidentes.
5.4.
Contrato de Transporte Turístico
O
transporte turístico pode ser aéreo, ferroviário, rodoviário ou marítimo,
regulado por legislação específica e convenções internacionais.
a) Transporte aéreo
·
Regulamento (CE) n.º 261/2004: direitos dos passageiros em caso de
cancelamento, atraso ou recusa de embarque;
·
Convenção de Montreal (1999): responsabilidade por danos, atrasos e perda de bagagem.
b) Transporte rodoviário e marítimo
·
Contratos
regidos pelo Código Comercial e legislação sectorial;
·
Obrigações
de segurança, pontualidade e informação ao passageiro.
c)
Responsabilidade e seguros
As
empresas de transporte devem contratar seguros obrigatórios e responder por
danos causados aos passageiros, salvo em casos de força maior.
5.5.
Contratos Digitais e Plataformas Online
A
digitalização do turismo trouxe novos modelos contratuais, celebrados através
de plataformas como Booking, Airbnb, GetYourGuide, entre outras.
a) Natureza jurídica
·
Contratos
à distância, regidos pelo Decreto-Lei n.º 24/2014 (contratos
celebrados com consumidores);
·
Aplicação
do Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD) na recolha e tratamento de
dados pessoais.
b)
Cláusulas abusivas
A
jurisprudência tem identificado cláusulas abusivas em contratos digitais, como:
·
Exclusão
de responsabilidade por cancelamentos;
· Penalizações desproporcionadas;
·
Limitação
do direito de reembolso.
A Direcção-geral
do Consumidor e a ASAE têm reforçado a fiscalização
destas práticas.
5.6.
Contratos de Turismo de Natureza e Rural
Estes
contratos envolvem prestações específicas, como alojamento em ambiente rural, actividades
ao ar livre, visitas guiadas, entre outros.
a) Regime jurídico
·
Regidos
pelo RJET e pela legislação ambiental;
·
Devem
respeitar normas de segurança, protecção da biodiversidade e ordenamento do
território.
b)
Responsabilidade
Os
operadores são responsáveis por acidentes, incumprimento das condições
contratadas e danos ambientais, podendo ser sancionados civil e penalmente.
5.7.
Resolução de Litígios Contratuais
A
resolução de litígios em matéria contratual turística pode ocorrer por via:
·
Judicial:
tribunais cíveis e administrativos;
·
Extrajudicial:
centros de arbitragem de conflitos de consumo;
·
Online:
plataforma europeia de resolução de litígios em linha (ODR).
A
mediação e a arbitragem têm sido incentivadas como formas céleres e eficazes de
resolução de conflitos, especialmente em contratos transfronteiriços.
Bibliografia:
· MENEZES LEITÃO, L. (2022). Direito dos Contratos. Coimbra: Almedina.
· BARROS, M. (2017). Direito do Consumo. Lisboa: Quid Juris.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Decreto-Lei
n.º 17/2018, de 8 de Março (Viagens organizadas).
·
Decreto-Lei
n.º 128/2014, de 29 de Agosto (Alojamento local).
·
Regulamento
(CE) n.º 261/2004 (Direitos dos passageiros aéreos).
· Convenção de Montreal (1999).
·
Decreto-Lei
n.º 24/2014 (Contratos celebrados à distância).
· Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD).
·
Jurisprudência
dos Tribunais da Relação e do Supremo Tribunal de Justiça.
Capítulo 6
Direitos dos Turistas e dos Consumidores
6.1.
Introdução: A centralidade da protecção jurídica do turista
O
turista, enquanto utilizador de serviços turísticos, é simultaneamente
consumidor, utente e cidadão. Esta multiplicidade de estatutos exige uma
abordagem jurídica integrada, que assegure a protecção dos seus direitos em
todas as fases da experiência turística - desde a contratação até à fruição dos
serviços e à eventual resolução de litígios.
A
vulnerabilidade do turista, muitas vezes em território desconhecido, com
barreiras linguísticas e dependente de intermediários, justifica um regime
jurídico reforçado de protecção, inspirado nos princípios do direito do
consumo, da boa-fé contratual e da responsabilidade objectiva.
6.2.
Direitos Fundamentais dos Turistas
Os direitos
dos turistas decorrem de normas constitucionais, legais e internacionais, e
incluem:
·
Direito à informação clara e completa sobre os serviços contratados (art. 60.º da CRP;
Lei n.º 24/96);
·
Direito à segurança física e patrimonial durante a viagem e estadia;
·
Direito à acessibilidade e não discriminação, especialmente para pessoas com mobilidade
reduzida;
·
Direito à privacidade e protecção de dados pessoais, nos termos do RGPD;
·
Direito à reparação de danos em caso de incumprimento contratual ou acidente;
·
Direito à assistência consular, em caso de emergência no estrangeiro.
Estes
direitos são reforçados por instrumentos internacionais, como o Código
Global de Ética para o Turismo da OMT, que consagra princípios de respeito
mútuo, liberdade de circulação e protecção dos grupos vulneráveis.
6.3. Protecção
do Consumidor no Sector Turístico
O
turista é juridicamente equiparado ao consumidor, beneficiando das garantias
previstas na Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, e no Decreto-Lei
n.º 24/2014, sobre contratos celebrados à distância.
a) Princípios fundamentais
·
Princípio da transparência: obrigação de fornecer informação pré-contratual clara, verdadeira e
acessível;
·
Princípio da equidade: proibição de cláusulas abusivas e práticas comerciais desleais;
·
Princípio da reparação: direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.
b)
Obrigações dos prestadores de serviços turísticos
·
Informar
sobre preços, condições de cancelamento, seguros e responsabilidades;
·
Garantir
a conformidade dos serviços com o contrato;
·
Disponibilizar
canais de reclamação e resolução de litígios.
6.4.
Direitos em Contratos Específicos
a)
Viagens organizadas
Nos
termos do Decreto-Lei n.º 17/2018, o turista tem direito a:
·
Informação
prévia sobre o itinerário, alojamento, refeições e seguros;
·
Cancelamento
sem penalização em caso de circunstâncias excepcionais;
·
Reembolso
integral em caso de incumprimento;
·
Assistência
em caso de dificuldades durante a viagem.
b)
Alojamento turístico
O
hóspede tem direito a:
·
Condições
de higiene, segurança e acessibilidade;
·
Respeito
pela privacidade e protecção de dados;
·
Reembolso
em caso de cancelamento ou incumprimento;
·
Indemnização
por furtos, acidentes ou danos.
c)
Transporte turístico
O
passageiro tem direito a:
·
Informação
sobre horários, tarifas e condições;
·
Compensação
por atrasos, cancelamentos ou perda de bagagem (Regulamento CE n.º 261/2004);
·
Assistência
em caso de interrupção da viagem.
6.5.
Mecanismos de Tutela dos Direitos dos Turistas
a)
Reclamações e Livro de Reclamações
Todos
os estabelecimentos turísticos devem disponibilizar o Livro de
Reclamações, físico e electrónico, nos termos do Decreto-Lei
n.º 74/2017. As reclamações são encaminhadas para a Direcção-geral
do Consumidor e para a ASAE, podendo originar
processos de contra-ordenação.
b) Centros
de Arbitragem de Conflitos de Consumo
Os
turistas podem recorrer aos centros de arbitragem para
resolver litígios de forma célere, gratuita e imparcial.
Estes
centros têm competência para apreciar conflitos relacionados com:
· Cancelamento de reservas;
· Qualidade dos serviços;
· Cláusulas abusivas;
· Responsabilidade por danos.
c)
Plataforma Europeia de Resolução de Litígios em Linha (ODR)
Disponível
em https://consumer-redress.ec.europa.eu/site-relocation_en esta plataforma permite a resolução
de litígios transfronteiriços entre consumidores e prestadores de serviços
turísticos.
6.6.
Jurisprudência Relevante
A
jurisprudência portuguesa tem vindo a consolidar a protecção dos turistas, reconhecendo:
·
O
direito ao reembolso por cancelamento de viagens devido à pandemia;
·
A
responsabilidade dos hotéis por furtos em quartos;
·
A
invalidade de cláusulas que excluem responsabilidade por acidentes;
·
A
obrigação de indemnizar por danos morais em casos de incumprimento grave.
Exemplo:
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12.03.2021, reconheceu o direito à
indemnização por cancelamento de viagem organizada sem aviso prévio, com base
na violação do dever de informação e na frustração legítima das expectativas do
consumidor.
6.7. Direitos Especiais em
Contexto de Crise ou Emergência
A protecção
jurídica dos turistas ganha especial relevância em situações de crise, como
pandemias, catástrofes naturais, conflitos armados ou falência de operadores
turísticos. Nestes contextos, o ordenamento jurídico português e europeu prevê
mecanismos específicos de tutela:
a)
Cancelamento por força maior
Nos
termos do Decreto-Lei n.º 17/2018, o turista tem direito à
resolução do contrato sem penalização quando ocorrem “circunstâncias
inevitáveis e excepcionais” no destino ou nas imediações.
Exemplos incluem:
·
Declaração
de estado de emergência;
· Encerramento de fronteiras;
·
Suspensão
de voos ou serviços essenciais.
b)
Reembolso e assistência
O
organizador da viagem deve garantir:
·
Reembolso
integral no prazo de 14 dias;
·
Apoio
logístico e financeiro para repatriamento;
·
Informação
clara e actualizada sobre os direitos do consumidor.
c)
Jurisprudência relevante
O Acórdão
do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15.09.2022, reconheceu o direito
ao reembolso integral de uma viagem cancelada devido à pandemia de COVID-19,
mesmo quando o contrato previa penalizações, com base na prevalência do regime
de protecção do consumidor.
6.8. Protecção
de Dados Pessoais no Turismo
A
crescente digitalização dos serviços turísticos implica o tratamento intensivo
de dados pessoais dos turistas, como nomes, contactos, preferências,
localização, dados bancários e documentos de identificação.
a)
Aplicação do RGPD
O Regulamento
(UE) 2016/679 (RGPD) aplica-se a todas as entidades que operam em
Portugal e tratam dados de residentes na UE.
No sector
turístico, são especialmente relevantes:
·
Plataformas
de reservas (Booking, Airbnb);
· Agências de viagens;
· Estabelecimentos hoteleiros;
· Transportadoras e operadores turísticos.
b)
Direitos dos titulares dos dados
Os
turistas têm direito a:
·
Informação
clara sobre o tratamento dos seus dados;
·
Consentimento
livre, informado e específico;
·
Acesso,
rectificação e apagamento dos dados;
·
Oposição
ao tratamento para fins de marketing;
· Portabilidade dos dados.
c) Responsabilidade dos operadores
As entidades turísticas devem:
·
Nomear
encarregado de protecção de dados (DPO), quando aplicável;
·
Implementar
medidas de segurança técnica e organizativa;
·
Notificar
violações de dados à CNPD e aos titulares;
·
Celebrar
contratos de subcontratação com cláusulas específicas.
6.9.
Turismo Inclusivo e Direitos das Pessoas com Deficiência
A
acessibilidade é um direito fundamental consagrado na Convenção das
Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,
ratificada por Portugal, e reforçado pela legislação nacional.
a) Obrigações dos operadores turísticos
·
Garantir
acessibilidade física nos empreendimentos (rampas, elevadores, quartos
adaptados);
·
Disponibilizar
informação acessível (braille, linguagem simples, pictogramas);
·
Formar
o pessoal para atendimento inclusivo.
b)
Fiscalização e incentivos
O Turismo
de Portugal, I.P. promove programas de financiamento para adaptação de
infra-estruturas, como o Programa Valorizar - Linha de Apoio à
Acessibilidade. A ASAE fiscaliza o cumprimento das normas
de acessibilidade.
6.10.
Responsabilidade Civil e Penal dos Prestadores de Serviços Turísticos
A
violação dos direitos dos turistas pode gerar responsabilidade civil, penal e
contraordenacional, dependendo da gravidade e natureza da infracção.
a)
Responsabilidade civil
Nos
termos do Código Civil, os prestadores respondem por:
·
Danos
patrimoniais (ex. perda de bagagem, cancelamento de serviços);
·
Danos
não patrimoniais (ex. stress, frustração, humilhação);
·
Responsabilidade
objectiva em casos de risco (ex.: acidentes em piscinas, excursões radicais).
b)
Responsabilidade penal
Pode
ocorrer em casos de:
·
Publicidade
enganosa (art. 248.º do Código Penal);
· Burla (art. 217.º);
·
Violação
de regras de segurança com resultado de lesões ou morte.
c) Contra-ordenações
A
legislação turística prevê coimas e sanções acessórias para infrações como:
· Falta de licenciamento;
· Omissão de informação obrigatória;
· Cláusulas abusivas em contratos.
6.11.
Educação e Literacia Jurídica do Turista
A protecção
jurídica dos turistas depende também da sua literacia legal - ou seja, do
conhecimento dos seus direitos e da capacidade de os exercer. O Estado e as
entidades privadas devem promover:
·
Campanhas
informativas sobre direitos do consumidor;
·
Guias
práticos em vários idiomas;
·
Formação
dos profissionais do sector em ética e direito do turismo.
Exemplo:
O portal do Turismo de Portugal disponibiliza materiais
educativos sobre direitos dos turistas, acessibilidade, segurança e sustentabilidade.
Bibliografia:
· RODRIGUES, A. (2020). Direitos Fundamentais e Turismo. Lisboa: Edições Sílabo.
·
Comissão
Europeia. (2019). Guia do Consumidor Europeu em Viagens.
·
CNPD.
(2021). Protecção de Dados no Sector Turístico.
·
Convenção
das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
·
Acórdãos
dos Tribunais da Relação (Lisboa, Coimbra, Porto) sobre responsabilidade civil
em turismo.
·
Relatórios
da ASAE e da Direcção-geral do Consumidor.
Capítulo 7
Turismo Sustentável e Direito Ambiental
7.1. Introdução: A urgência da
sustentabilidade no turismo
O
turismo, enquanto actividade económica de grande impacto territorial, ambiental
e social, enfrenta o desafio de se tornar sustentável. A massificação do
turismo, a pressão sobre os ecossistemas, a degradação de património natural e
cultural, e as alterações climáticas exigem uma abordagem jurídica que promova
o equilíbrio entre desenvolvimento económico e protecção ambiental.
O
conceito de turismo sustentável, consagrado pela OMT. refere-se à actividade que
respeita o meio ambiente, valoriza as comunidades locais e assegura a
viabilidade económica a longo prazo. Em Portugal, este princípio tem vindo a
ser incorporado na legislação turística e ambiental, bem como nos instrumentos
de ordenamento do território.
7.2.
Princípios do Turismo Sustentável
O
turismo sustentável assenta em três pilares fundamentais:
·
Ambiental: protecção
dos recursos naturais, biodiversidade, qualidade da água e do ar e gestão de
resíduos;
·
Social: respeito
pelas comunidades locais, inclusão, acessibilidade e valorização cultural;
·
Económico:
viabilidade financeira dos empreendimentos, emprego digno e redistribuição de
benefícios.
Estes
princípios são reforçados por instrumentos internacionais como:
·
Agenda 2030 das Nações Unidas – Objectivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS), nomeadamente o ODS 12 (consumo e produção sustentáveis) e o ODS 13 (acção
climática);
·
Convenção sobre Diversidade Biológica (1992) – protecção da biodiversidade em zonas
turísticas;
·
Carta Europeia do Turismo Sustentável – promovida pela Federação EUROPARC.
7.3.
Enquadramento Legal Ambiental em Portugal
O
ordenamento jurídico português consagra diversos instrumentos legais que
regulam o impacto ambiental da actividade turística:
a)
Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 19/2014)
Estabelece
os princípios da prevenção, precaução, responsabilidade e participação pública,
aplicáveis à instalação e funcionamento de empreendimentos turísticos.
b)
Regime Jurídico da Avaliação de Impacto Ambiental (Decreto-Lei n.º 151-B/2013)
Prevê
a obrigatoriedade de avaliação ambiental para projectos turísticos de grande
dimensão ou localizados em áreas sensíveis.
c)
Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (Decreto-Lei n.º
142/2008)
Regula
a compatibilidade dos empreendimentos turísticos com áreas protegidas, como
parques naturais, reservas e sítios da Rede Natura 2000.
d)
Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos (RJET)
Inclui
exigências ambientais específicas, como eficiência energética, gestão de
resíduos e integração paisagística.
7.4.
Instrumentos de Ordenamento do Território
A
localização e instalação de empreendimentos turísticos devem respeitar os
instrumentos de gestão territorial, que incluem:
·
Plano Director Municipal (PDM) – define zonas urbanas, rurais, industriais e
turísticas;
·
Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) - regula a ocupação turística em zonas costeiras;
·
Plano de Ordenamento de Áreas Protegidas - compatibiliza turismo com conservação da
natureza;
·
Plano Regional de Ordenamento do Território (PROT) - orienta o desenvolvimento turístico
regional.
A
compatibilidade dos projectos turísticos com estes instrumentos é condição
essencial para o licenciamento e funcionamento.
7.5.
Certificação Ambiental e Boas Práticas
A
promoção do turismo sustentável passa também pela adopção voluntária de
sistemas de certificação ambiental, como:
·
Green Key -
certificação internacional para alojamentos turísticos com boas práticas
ambientais;
·
Biosphere Responsible Tourism – alinhado com os ODS;
·
ISO 14001 –
sistema de gestão ambiental aplicável a empresas turísticas.
Estas
certificações valorizam os empreendimentos junto dos consumidores e incentivam
a melhoria contínua.
7.6.
Responsabilidade Ambiental dos Operadores Turísticos
Os
operadores turísticos estão sujeitos a responsabilidade ambiental nos termos da
Lei n.º 19/2014 e do Decreto-Lei n.º 147/2008,
que estabelece o regime da responsabilidade ambiental.
a)
Responsabilidade objectiva
Aplica-se
em caso de danos significativos ao ambiente, independentemente de culpa, exigindo
medidas de reparação e compensação.
b)
Responsabilidade penal
Pode
ocorrer em casos de:
·
Poluição
de águas ou solos;
· Destruição de habitats protegidos;
·
Construção
ilegal em áreas sensíveis.
c)
Responsabilidade administrativa
Inclui
coimas, suspensão de licenças e encerramento de empreendimentos em caso de infracção
ambiental.
7.7.
Turismo de Natureza e Ecoturismo
O
turismo de natureza é regulado pelo Decreto-Lei n.º 142/2008 e
por normas específicas do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas).
Este
tipo de turismo inclui:
·
Observação
de fauna e flora;
·
Caminhadas,
ciclismo, actividades ao ar livre;
·
Alojamento
em áreas rurais e protegidas.
Os
operadores devem obter autorização do ICNF, respeitar os planos de ordenamento
e adoptar práticas de baixo impacto.
7.8.
Desafios Contemporâneos e Propostas de Reforma
O
turismo sustentável enfrenta diversos desafios jurídicos e práticos:
·
Sobreturismo em
cidades como Lisboa e Porto, com pressão sobre habitação, mobilidade e
património;
·
Alterações climáticas, que afectam destinos costeiros e zonas de montanha;
·
Digitalização,
que dificulta o controlo ambiental de plataformas descentralizadas;
·
Falta de fiscalização eficaz em zonas remotas ou dispersas.
Propostas de reforma incluem:
·
Reforço
da articulação entre turismo e ambiente nos instrumentos de ordenamento;
·
Criação
de incentivos fiscais para empreendimentos sustentáveis;
·
Adopção
obrigatória de certificações ambientais em zonas sensíveis;
·
Maior
participação das comunidades locais na definição de políticas turísticas.
7.9.
Políticas Públicas de Promoção do Turismo Sustentável
O
Estado português tem vindo a implementar políticas públicas que visam integrar
a sustentabilidade na estratégia turística nacional.
Destacam-se:
a)
Estratégia Turismo 2027
Lançada
pelo Turismo de Portugal, esta estratégia define como visão “afirmar Portugal
como um destino turístico sustentável e inovador”.
Os seus eixos incluem:
·
Valorização
dos territórios de baixa densidade;
· Diversificação da oferta turística;
· Redução da sazonalidade;
·
Promoção
da eficiência energética e da economia circular.
b)
Programa Valorizar
Instrumento
financeiro que apoia projectos de qualificação da oferta turística, com linhas
específicas para:
· Acessibilidade;
· Sustentabilidade ambiental;
· Turismo industrial e cultural;
· Reabilitação de património.
c) REVIVE
Programa
que promove a recuperação de imóveis públicos com valor patrimonial para fins
turísticos, com critérios de sustentabilidade e integração local.
7.10.
Participação das Comunidades Locais
A sustentabilidade
do turismo depende da inclusão das comunidades locais na definição,
implementação e monitorização dos projectos turísticos. O direito à
participação está consagrado na Lei de Bases do Ambiente e
reforçado por mecanismos como:
·
Consultas
públicas nos processos de avaliação ambiental;
·
Conselhos
consultivos das áreas protegidas;
·
Parcerias
entre municípios, associações locais e operadores turísticos.
A
jurisprudência tem reconhecido o valor jurídico da participação comunitária,
nomeadamente em decisões sobre licenciamento de empreendimentos em zonas
sensíveis.
7.11.
Casos Exemplares em Portugal
a)
Aldeia de Cerdeira (Serra da Lousã)
Projecto
de turismo criativo e sustentável, com recuperação de casas em xisto,
integração com a natureza e envolvimento da comunidade local. Recebeu
distinções internacionais pela sua abordagem ecológica e cultural.
b)
Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina
Exemplo
de compatibilização entre turismo de natureza e conservação ambiental, com
trilhos pedestres, alojamentos sustentáveis e regulamentação rigorosa da
ocupação costeira.
c)
Azores Sustainability Charter
Os
Açores foram reconhecidos como destino turístico sustentável pela Global
Sustainable Tourism Council (GSTC), com base em indicadores ambientais, sociais
e económicos.
7.12.
Fiscalização Ambiental no Sector Turístico
A
fiscalização ambiental dos empreendimentos turísticos é assegurada por várias
entidades:
·
ASAE: verifica o
cumprimento das normas de higiene, segurança e licenciamento;
·
ICNF: fiscaliza actividades
em áreas protegidas e turismo de natureza;
·
Agências Regionais de Ambiente: monitorizam impactos ambientais e licenças;
·
Ministério Público: actua em casos de crime ambiental ou violação de normas urbanísticas.
A actuação
destas entidades pode resultar em:
· Coimas e sanções acessórias;
·
Suspensão
ou revogação de licenças;
·
Ações
judiciais por danos ambientais.
7.13.
Educação Ambiental e Sensibilização Turística
A
promoção de comportamentos responsáveis por parte dos turistas é essencial para
a sustentabilidade.
As boas práticas incluem:
·
Campanhas
de sensibilização sobre conservação da natureza;
·
Guias
ecológicos em alojamentos e parques naturais;
·
Formação
dos profissionais do sector em ética ambiental;
·
Incentivo
ao uso de transportes públicos e mobilidade suave.
Exemplo:
O programa “Turismo Responsável” do Turismo de Portugal inclui materiais
educativos para turistas e operadores, com foco na redução da pegada ecológica.
7.14.
Propostas Legislativas e Tendências Futuras
O
futuro do turismo sustentável em Portugal poderá passar por:
·
Revisão do RJET
para incluir critérios obrigatórios de sustentabilidade;
·
Criação de um Código de Conduta Ambiental para o Turismo, com valor normativo;
·
Incentivos fiscais para empreendimentos com certificação ecológica;
·
Obrigatoriedade de relatórios de sustentabilidade para grandes operadores;
·
Integração da sustentabilidade nos currículos de formação turística.
Estas
propostas visam consolidar o turismo como actividade compatível com os objectivos
ambientais e com os compromissos internacionais assumidos por Portugal.
7.15.
Intersecção com o Direito Urbanístico e Imobiliário
A
instalação de empreendimentos turísticos em áreas sensíveis ou de elevado valor
ecológico levanta questões jurídicas que cruzam o direito ambiental com o direito
urbanístico e o direito imobiliário.
a)
Compatibilidade com os instrumentos de gestão territorial
·
Os projectos
turísticos devem respeitar os usos definidos nos PDM, PROT e POOC.
·
A
reconversão de imóveis para fins turísticos exige pareceres ambientais e
urbanísticos.
b) Reabilitação urbana e turismo
·
O
turismo pode ser motor de reabilitação urbana, mas também de gentrificação e
pressão imobiliária.
·
A
legislação sobre reabilitação urbana (Decreto-Lei n.º 307/2009) deve ser
articulada com critérios de sustentabilidade.
c)
Jurisprudência relevante
Exemplo:
O Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, de 22.06.2023,
anulou a licença de construção de um hotel em zona de REN por violação do plano
de ordenamento e ausência de avaliação ambiental.
7.16.
Turismo Sustentável e Direito Internacional
Portugal
está vinculado a diversos tratados e convenções internacionais que influenciam
a regulação do turismo sustentável:
·
Convenção de Ramsar (1971) - protecção de zonas húmidas de importância internacional;
·
Convenção de Berna (1979) - conservação da vida selvagem e dos habitats naturais;
·
Convenção de Faro (2005) - valor do património cultural para a sociedade;
·
Acordos multilaterais sobre alterações climáticas, como o Acordo de Paris (2015).
Estes
instrumentos impõem obrigações ao Estado português e orientam a actuação
legislativa e administrativa no sector turístico.
7.17.
Turismo Azul e Sustentabilidade Marinha
O
conceito de turismo azul refere-se ao turismo costeiro e
marítimo que respeita os ecossistemas marinhos e promove a economia circular
nas zonas costeiras.
a) Regulação específica
·
O Plano
de Situação do Ordenamento do Espaço Marítimo (PSOEM) define usos
compatíveis com actividades turísticas.
·
O Decreto-Lei
n.º 38/2015 regula o licenciamento de actividades marítimo-turísticas.
b) Boas práticas
·
Turismo
náutico com embarcações de baixo impacto;
·
Observação
de cetáceos com regras de aproximação;
·
Educação
ambiental em praias e marinas.
7.18.
Turismo Rural e Valorização do Interior
O
turismo sustentável é também uma ferramenta de coesão territorial,
promovendo o desenvolvimento das regiões de baixa densidade populacional.
a) Incentivos legais
·
Benefícios
fiscais para empreendimentos em zonas rurais;
·
Programas
de financiamento como o Turismo de Interior;
·
Simplificação
de licenciamento para turismo em espaço rural.
b) Desafios
· Preservação da autenticidade cultural;
·
Gestão
de recursos naturais escassos;
·
Formação
de operadores locais em práticas sustentáveis.
7.19.
Conclusão: O Direito como instrumento de sustentabilidade turística
O
turismo sustentável não é apenas uma tendência - é uma exigência ética,
jurídica e estratégica. O direito tem um papel central na construção de um
modelo turístico que respeite os limites ecológicos, valorize as comunidades e
assegure benefícios económicos duradouros.
A
consolidação de um Direito do Turismo Sustentável exige:
·
Integração
normativa entre os diversos ramos do direito;
· Formação jurídica especializada;
· Fiscalização eficaz e transparente;
·
Participação
activa dos cidadãos e das comunidades.
Portugal
tem condições únicas para liderar este paradigma, combinando património natural
e cultural com uma tradição jurídica sólida e uma crescente consciência
ambiental.
7.20. Ética e Responsabilidade Social
no Turismo
A sustentabilidade não se esgota na conformidade legal -
exige também uma abordagem ética e socialmente responsável por parte dos
operadores turísticos, dos consumidores e das autoridades públicas.
a) Princípios éticos fundamentais
- Respeito pela cultura local: evitar práticas de apropriação
cultural ou exploração;
- Equidade social: garantir que os benefícios do
turismo são distribuídos de forma justa;
- Transparência: comunicar de forma clara os
impactos ambientais e sociais dos empreendimentos;
- Integridade empresarial: rejeitar práticas de
greenwashing ou marketing enganoso.
b) Códigos de conduta
- O Código Global de Ética para o Turismo da
OMT propõe directrizes para turistas, empresas e governos, incluindo
respeito pelos direitos humanos, protecção ambiental e promoção da paz.
7.21. Turismo Sustentável e Tecnologia
A inovação tecnológica pode ser uma aliada poderosa da
sustentabilidade turística, desde que usada com responsabilidade.
a) Ferramentas digitais
- Plataformas de gestão ambiental:
monitorização de consumos, gestão de resíduos, eficiência energética;
- Aplicações móveis: educação ambiental, guias
ecológicos, mapas de trilhos sustentáveis;
- Big Data e IA: previsão de fluxos turísticos,
gestão de capacidade, redução da pressão sobre destinos frágeis.
b) Riscos tecnológicos
- Excesso de
digitalização pode excluir populações menos conectadas;
- Tratamento
de dados pessoais exige conformidade com o RGPD;
- Dependência
de plataformas globais pode dificultar a regulação local e a
redistribuição dos benefícios.
7.22. Comparação Internacional: Modelos
de Regulação Sustentável
Portugal pode aprender com boas práticas internacionais
em matéria de turismo sustentável:
|
País |
Medida
de destaque |
Impacto |
|
Costa Rica |
Certificação CST (Turismo
Sustentável) |
Referência mundial em ecoturismo |
|
Islândia |
Limitação de acesso a áreas frágeis |
Preservação de ecossistemas
vulcânicos |
|
Nova Zelândia |
Taxa de conservação para turistas estrangeiros |
Financiamento directo da protecção ambiental |
|
França |
Regulamentação rigorosa do Airbnb em zonas urbanas |
Controlo da pressão imobiliária |
Estas experiências mostram que a regulação eficaz depende
de vontade política, envolvimento comunitário e fiscalização activa.
7.23. Reflexão Final: O papel
transformador do Direito
O Direito não é apenas um instrumento de controlo - é também
um motor de transformação.
No contexto do turismo sustentável, o Direito pode:
- Promover comportamentos
responsáveis;
- Incentivar modelos económicos
regenerativos;
- Proteger os mais vulneráveis - humanos e não humanos;
- Garantir que o turismo contribui para o bem comum, e
não apenas para o lucro privado.
A construção de um turismo verdadeiramente sustentável
exige juristas atentos, legisladores ousados e cidadãos conscientes. Este
capítulo é um convite à acção informada, ética e juridicamente fundamentada.
7.24.
Síntese Integrada dos Eixos Jurídicos da Sustentabilidade Turística
Ao
longo deste capítulo, foram identificados os principais eixos jurídicos que
sustentam uma abordagem integrada à sustentabilidade no turismo:
·
Ambiental:
através da legislação sobre conservação da natureza, avaliação de impacto
ambiental e responsabilidade ecológica;
·
Territorial: por
meio dos instrumentos de ordenamento do território que regulam a localização e
densidade dos empreendimentos turísticos;
·
Social: com
normas que promovem acessibilidade, inclusão e participação comunitária;
·
Económico: por
via de incentivos fiscais, programas de financiamento e certificações que
valorizam práticas sustentáveis.
A
articulação entre estes eixos exige uma actuação coordenada entre diferentes
entidades públicas, operadores privados e cidadãos, com base em princípios de
legalidade, transparência e justiça intergeracional.
7.25.
O Papel do Jurista na Construção do Turismo Sustentável
O
jurista seja advogado, magistrado, académico ou legislador desempenha um papel
essencial na consolidação do turismo sustentável:
·
Como intérprete:
clarificando normas complexas e promovendo uma leitura sistemática e
teleológica da legislação;
·
Como agente de mudança: propondo reformas legislativas, participando em processos de consulta
pública e defendendo os direitos das comunidades e do ambiente;
·
Como educador:
contribuindo para a literacia jurídica dos operadores turísticos e dos
consumidores;
·
Como fiscalizador: actuando judicialmente ou administrativamente em casos de violação das
normas ambientais e turísticas.
A
formação jurídica deve, por isso, incluir conteúdos sobre turismo sustentável,
direito ambiental, ordenamento do território e ética profissional, preparando
os juristas para os desafios contemporâneos.
7.26.
Conclusão Geral
O
turismo sustentável não é uma utopia - é uma necessidade jurídica, ecológica e
civilizacional. A legislação portuguesa oferece uma base sólida, mas ainda
fragmentada, que precisa de ser consolidada num verdadeiro corpo
normativo do turismo sustentável, com coerência, eficácia e
aplicabilidade prática.
A
transição para um modelo turístico sustentável exige:
· Revisão e harmonização legislativa;
·
Fortalecimento da fiscalização e da responsabilização;
·
Promoção da educação ambiental e jurídica;
·
Participação activa das comunidades e dos turistas.
Este
capítulo procurou demonstrar que o Direito não é apenas um reflexo da realidade
mas também um instrumento para moldá-la. E no caso do turismo, esse molde deve
ser verde, justo e duradouro.
7.27.
Integração da Sustentabilidade nos Contratos Turísticos
A
sustentabilidade pode e deve ser incorporada nos próprios contratos celebrados
entre operadores e turistas, reforçando o compromisso jurídico com práticas
responsáveis.
a) Cláusulas ambientais
·
Utilização
de materiais ecológicos e práticas de baixo impacto;
·
Compromisso
com a gestão eficiente de energia e resíduos;
·
Preferência
por fornecedores locais e sustentáveis.
b) Cláusulas sociais
·
Respeito
pelos direitos laborais dos trabalhadores envolvidos;
·
Inclusão
de práticas de turismo acessível;
·
Apoio
a projectos comunitários e culturais.
Estas
cláusulas podem ser voluntárias ou exigidas por programas de certificação, e
são cada vez mais valorizadas por consumidores conscientes.
7.28.
Turismo Sustentável como Direito Colectivo
A
doutrina jurídica começa a reconhecer o turismo sustentável como um direito
colectivo difuso, associado ao direito ao ambiente, à cultura e ao
desenvolvimento equilibrado.
a) Fundamento constitucional
·
Artigo
66.º da Constituição da República Portuguesa: direito ao ambiente e qualidade
de vida;
·
Artigo
9.º: tarefas fundamentais do Estado, incluindo a protecção da natureza e do
património cultural.
b) Implicações jurídicas
·
Legitimidade
das associações ambientais e culturais para interpor acções judiciais;
·
Possibilidade
de tutela cautelar para impedir danos irreversíveis causados por
empreendimentos turísticos;
·
Reconhecimento
do interesse público na regulação do turismo.
7.29.
O Futuro do Direito do Turismo Sustentável
O
futuro deste ramo jurídico aponta para uma maior sofisticação normativa e
integração com outras áreas emergentes:
·
Direito Climático: adaptação dos destinos turísticos às alterações climáticas;
·
Direito da Mobilidade Sustentável: incentivo ao transporte público, bicicletas e caminhadas;
·
Direito da Economia Circular: reutilização de recursos, redução de desperdício e inovação ecológica;
·
Direito da Inteligência Artificial: uso ético de algoritmos na gestão turística.
A
interdisciplinaridade será essencial para formar juristas capazes de lidar com
os desafios complexos do turismo do século XXI.
7.30.
Encerramento
Este
capítulo procurou demonstrar que o turismo sustentável não é apenas uma opção mas
tamvém é uma exigência jurídica, ética e estratégica. A legislação portuguesa
oferece instrumentos valiosos, mas ainda carece de maior integração,
fiscalização e aplicação prática.
A
construção de um modelo turístico sustentável exige:
· Compromisso político e legislativo;
· Formação jurídica especializada;
·
Participação activa das comunidades e dos turistas;
· Fiscalização eficaz e transparente.
O
Direito do Turismo Sustentável é, acima de tudo, uma expressão de
responsabilidade colectiva perante o território, o ambiente e as gerações
futuras.
7.31.
Turismo Sustentável e Justiça Intergeracional
Um dos
fundamentos éticos e jurídicos da sustentabilidade é o princípio da justiça
intergeracional como ideia de
que as decisões tomadas hoje não devem comprometer os direitos das gerações
futuras.
a) Enquadramento jurídico
·
Consagrado
implicitamente no artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa (direito
ao ambiente);
·
Reforçado
por tratados internacionais como a Carta das Responsabilidades das
Gerações Futuras da UNESCO;
·
Aplicável
ao turismo na forma de gestão responsável dos recursos naturais, culturais e
sociais.
b) Implicações práticas
·
Planeamento
turístico com visão de longo prazo;
·
Avaliação
dos impactos cumulativos e não apenas imediatos;
·
Inclusão
de indicadores de sustentabilidade nos relatórios de actividade turística.
7.32.
Turismo Sustentável e Direitos Humanos
O
turismo sustentável está intimamente ligado à promoção e protecção dos direitos
humanos, especialmente em contextos de turismo internacional, turismo
em comunidades vulneráveis e turismo em territórios indígenas.
a) Riscos identificados
·
Exploração
laboral em cadeias turísticas;
·
Deslocamento
de populações locais por grandes empreendimentos;
·
Violação
da privacidade e da dignidade cultural.
b) Respostas jurídicas
·
Aplicação
da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Convenção
169 da OIT sobre povos indígenas;
·
Fiscalização
por parte de entidades como a ASAE e o Ministério Público;
·
Inclusão
de cláusulas de respeito pelos direitos humanos em contratos turísticos e
políticas empresariais.
7.33.
Turismo Sustentável e Economia Regenerativa
Mais
do que minimizar impactos negativos, o turismo sustentável pode ser um motor de
regeneração ecológica e social como conceito que ultrapassa a
sustentabilidade tradicional.
a) Exemplos de práticas regenerativas
·
Reflorestação
associada a empreendimentos turísticos;
·
Recuperação
de património abandonado com envolvimento comunitário;
·
Turismo
científico e educativo com impacto positivo nos ecossistemas.
b)
Enquadramento legal emergente
Embora
ainda não exista legislação específica sobre economia regenerativa, o Decreto-Lei
n.º 147/2008 sobre responsabilidade ambiental e os programas de
financiamento público já permitem enquadrar projectos com impacto positivo.
7.34.
Recomendações para Legisladores e Decisores Políticos
Para
consolidar o turismo sustentável como eixo estratégico do desenvolvimento
nacional, recomenda-se:
·
Criação
de um Código do Turismo Sustentável, com princípios,
obrigações e sanções específicas;
·
Revisão
do RJET para incluir critérios obrigatórios de sustentabilidade e regeneração;
·
Integração
da sustentabilidade nos currículos das escolas de turismo e hotelaria;
·
Financiamento
público condicionado ao cumprimento de metas ambientais e sociais;
·
Criação
de um Observatório Nacional do Turismo Sustentável, com
indicadores e relatórios periódicos.
7.35.
Encerramento Final
O
turismo sustentável é mais do que uma tendência pois é uma exigência ética,
jurídica e civilizacional. Este capítulo procurou demonstrar que o Direito tem
os instrumentos necessários para orientar o sector turístico rumo a um modelo
mais justo, equilibrado e duradouro.
A
transição exige coragem legislativa, inovação empresarial e consciência cidadã.
E exige, acima de tudo, juristas preparados para pensar o turismo não como um
produto, mas como uma experiência humana que deve respeitar o planeta, as
pessoas e o tempo.
Epílogo
O
Turismo como Guardião do Território
O
turismo, quando bem regulado, pode ser um aliado poderoso da conservação
ambiental e da valorização territorial. Em vez de ser um vector de degradação,
pode tornar-se um guardião da paisagem, da biodiversidade e da
memória colectiva. O Direito tem aqui um papel de mediação: entre o interesse
económico e o dever ecológico, entre o privado e o público, entre o presente e
o futuro.
O
Direito como Arquitectura da Sustentabilidade
Este
capítulo mostrou que o Direito não é apenas um conjunto de normas mas também
uma arquitectura de valores. Ao integrar princípios como
precaução, prevenção, participação e responsabilidade, o ordenamento jurídico
português oferece uma base sólida para a construção de um turismo sustentável.
Mas
essa base precisa de ser reforçada com:
·
Legislação mais integrada e transversal;
· Fiscalização eficaz e descentralizada;
·
Formação jurídica especializada no sector turístico;
·
Instrumentos de planeamento com visão ecológica e social.
Um
Chamado à Acção
Este
capítulo não termina com um ponto final, mas com um chamado à acção.
Juristas, decisores, empresários, académicos e cidadãos têm um papel a
desempenhar na transformação do turismo em Portugal. A sustentabilidade não é
um destino é um caminho. E esse caminho começa com escolhas jurídicas
conscientes, informadas e corajosas.
Pós-escrito: Turismo Sustentável como
Paradigma Jurídico Emergente
O Direito do Turismo Sustentável como
ramo em afirmação
Ao longo deste capítulo, ficou claro que o turismo
sustentável não é apenas uma dimensão do Direito do Turismo mas também um paradigma
jurídico emergente, com princípios próprios, fontes normativas específicas
e uma lógica transversal que o aproxima do direito ambiental, urbanístico,
internacional, do consumo e até dos direitos humanos.
Este ramo começa a afirmar-se com:
- Doutrina especializada que propõe sistematizações e
modelos regulatórios;
- Jurisprudência inovadora que reconhece o valor jurídico da
sustentabilidade;
- Prática administrativa que integra critérios ecológicos
nos processos de licenciamento e fiscalização;
- Movimentos sociais e académicos que
pressionam por reformas legislativas e maior responsabilização.
Proposta de sistematização normativa
Para consolidar este ramo, propõe-se a criação de um Código
do Turismo Sustentável, com estrutura própria, que poderia incluir:
|
Título |
Conteúdo |
|
I – Princípios Gerais |
Sustentabilidade, precaução, equidade,
participação |
|
II – Planeamento e Ordenamento |
Compatibilidade com instrumentos
territoriais |
|
III – Licenciamento e Fiscalização |
Requisitos ambientais e
sociais |
|
IV – Responsabilidade |
Civil, penal e
administrativa |
|
V – Incentivos e Certificações |
Benefícios
fiscais e reconhecimento público |
|
VI – Participação e Educação |
Envolvimento
comunitário e literacia ecológica |
Este código funcionaria como referência para
legisladores, operadores e juristas, promovendo segurança jurídica e coerência
normativa.
Perspectiva de futuro: o turismo como
agente de regeneração
Mais do que evitar danos, o turismo pode ser um agente
de regeneração ecológica, cultural e social. O Direito tem o poder de
moldar esse papel, criando incentivos, obrigações e estruturas que transformem
o sector num motor de desenvolvimento sustentável.
Imagina
um turismo que:
- Refloresta em vez de desmatar;
- Revitaliza aldeias em vez de as desertificar;
- Valoriza culturas locais em vez de as homogeneizar;
- Educa os visitantes em vez de os alienar.
Esse turismo não é utópico mas é possível, e o Direito é
a ferramenta para o tornar real.
Epílogo
Expandido: O Turismo Sustentável como Responsabilidade Sistémica
Sustentabilidade
como eixo transversal da política pública
O
turismo sustentável não pode ser tratado como um nicho ou uma excepção e deve
ser um eixo transversal em todas as políticas públicas ligadas
ao território, à economia, à cultura e ao ambiente.
Isso
implica:
·
Integração interministerial: articulação entre os ministérios da Economia, Ambiente, Cultura, Infra-estruturas
e Coesão Territorial;
·
Planeamento estratégico nacional: incorporação da sustentabilidade turística nos
planos plurianuais e nos instrumentos de financiamento europeu;
·
Indicadores de desempenho: criação de métricas públicas que avaliem o impacto ambiental e social do sector
turístico.
O
papel das universidades e centros de investigação
A
academia tem um papel crucial na consolidação do turismo sustentável como campo
jurídico e científico.
As universidades devem:
·
Desenvolver
investigação aplicada sobre modelos de regulação, impacto
ambiental e inovação social no turismo;
·
Criar
cursos e pós-graduações em turismo sustentável, direito
ambiental e ordenamento turístico;
·
Estabelecer
parcerias com municípios e operadores para projectos-piloto e
laboratórios vivos.
Mobilização
da sociedade civil
A
sociedade civil através das associações ambientais, culturais, comunitárias e
de consumidores é um agente
indispensável na fiscalização, denúncia e construção de alternativas
sustentáveis.
O
ordenamento jurídico deve:
·
Reconhecer
a legitimidade activa destas entidades em acções judiciais e
administrativas;
·
Criar
mecanismos de participação vinculativa nos processos de
licenciamento e planeamento;
·
Financiar
projectos de educação ambiental e turismo responsável.
Turismo
sustentável como ciclo virtuoso
Quando
bem regulado, o turismo sustentável gera um ciclo virtuoso:
1.
Protege o ambiente, reduzindo impactos e regenerando ecossistemas;
2.
Valoriza o território, promovendo identidade, cultura e coesão;
3.
Gera emprego qualificado, com respeito pelos direitos laborais;
4.
Atrai turistas conscientes, que procuram experiências autênticas e éticas;
5.
Reforça a reputação internacional do destino como exemplo de responsabilidade.
Este
ciclo só se concretiza com uma base jurídica sólida, fiscalização eficaz e
compromisso colectivo.
Última
reflexão: o Direito como guardião da esperança
O
turismo sustentável é, no fundo, uma expressão de esperança: de que é possível
viajar sem destruir, conhecer sem explorar e desenvolver sem excluir. O Direito
é o guardião dessa esperança, transformando princípios em
normas, valores em obrigações, e sonhos em realidades tangíveis.
Este
capítulo termina, mas o seu impacto deve reverberar por todo o livro e por toda
a prática jurídica que se queira ética, informada e transformadora.
Fecho
Magistral
O
Turismo Sustentável como Elemento de Coesão Nacional
Num
país como Portugal diverso em paisagens, culturas, tradições e desafios
territoriais, o turismo sustentável pode ser um instrumento de coesão
nacional. Ao valorizar o interior, ao respeitar o litoral, ao proteger
o património e ao envolver as comunidades, o turismo torna-se uma ponte entre
regiões, gerações e visões de futuro.
O
Direito, ao regular esta actividade com sensibilidade ecológica e justiça
social, contribui para:
· Reduzir assimetrias territoriais;
· Reforçar a identidade cultural;
·
Promover
a inclusão e a equidade.
O
Jurista como Curador do Território
Mais
do que técnico, o jurista que actua no turismo sustentável é um curador
do território. Ele interpreta normas, mas também lê paisagens, escuta
comunidades e antecipa impactos.
A sua
atuação deve ser:
·
Preventiva,
evitando conflitos e degradação;
·
Educativa,
promovendo literacia jurídica e ambiental;
·
Transformadora,
propondo soluções inovadoras e justas.
Este
perfil exige formação multidisciplinar, sensibilidade ética e compromisso com o
bem comum.
Turismo
Sustentável como Cultura de Paz
Por
fim, o turismo sustentável é também uma cultura de paz. Ao
promover o encontro entre pessoas, o respeito pela diferença, a valorização da
natureza e a partilha de saberes, o turismo torna-se um espaço de reconciliação
entre o humano e o planeta.
O
Direito, ao proteger este espaço, contribui para:
·
A
dignidade das comunidades anfitriãs;
· A segurança dos visitantes;
· A integridade dos ecossistemas.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma exposição normativa mas uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o turismo. Um convite à responsabilidade, à
criatividade e à coragem. Um lembrete de que o turismo pode ser mais do que uma
indústria. Pode ser uma forma de cuidar, de aprender e de construir futuro.
Bibliografia:
· RODRIGUES, A. (2018). Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
· Organização Mundial do Turismo (OMT). Manual de Turismo Sustentável.
·
Lei
n.º 19/2014, de 14 de abril (Lei de Bases do Ambiente).
·
Decreto-Lei
n.º 151-B/2013, de 31 de Outubro (Avaliação de Impacte Ambiental).
·
Decreto-Lei
n.º 142/2008, de 24 de Julho (Conservação da Natureza).
·
Decreto-Lei
n.º 147/2008, de 29 de Julho (Responsabilidade Ambiental).
·
Relatórios
do ICNF e do Turismo de Portugal sobre turismo de natureza.
XXXAgenda 2030 das Nações Unidas
Objectivos de Desenvolvimento Sustentável
Capítulo 8
Turismo Digital e Protecção de Dados
8.1.
Introdução: A transformação digital do turismo
A
digitalização revolucionou o sector turístico. Desde a pesquisa de destinos até
à reserva de alojamento e experiências, os turistas interagem com plataformas
digitais, aplicações móveis e sistemas automatizados. Esta transformação trouxe
eficiência, personalização e acessibilidade, mas também riscos jurídicos
significativos, sobretudo no que toca à protecção de dados, à segurança
contratual e à regulação das plataformas.
O
Direito do Turismo deve adaptar-se a esta nova realidade, oferecendo respostas
normativas que garantam a confiança dos consumidores, a transparência dos
operadores e a conformidade com os princípios fundamentais da protecção de dados.
8.2.
Plataformas Digitais e Intermediação Turística
As
plataformas digitais como Booking, Airbnb, Expedia, GetYourGuide ou TripAdvisor
desempenham um papel central na intermediação turística. Estas plataformas
operam como marketplaces, agregando oferta e procura, mas levantam questões
jurídicas complexas:
a) Natureza jurídica da plataforma
·
Intermediário
técnico ou prestador de serviços?
·
Responsabilidade
por conteúdo gerado por utilizadores?
·
Obrigação
de verificação da identidade e licenciamento dos operadores?
b) Regulação europeia
·
Regulamento (UE) 2022/2065 - Lei dos Serviços Digitais (DSA): impõe obrigações de transparência,
moderação de conteúdo e protecção dos consumidores;
·
Regulamento (UE) 2019/1150 - P2B Regulation: regula a relação entre plataformas e empresas
utilizadoras.
8.3.
Contratos Electrónicos no Turismo
A
contratação turística é cada vez mais realizada por via electrónica, através de
websites, aplicações móveis ou sistemas automatizados.
a) Enquadramento jurídico
·
Decreto-Lei n.º 24/2014: regula os contratos celebrados à distância e fora do estabelecimento
comercial;
·
Código Civil:
aplica-se aos contratos electrónicos, com adaptações jurisprudenciais;
·
Regulamento eIDAS (UE) n.º 910/2014: sobre identificação electrónica e assinaturas
digitais.
b) Requisitos de validade
·
Consentimento
livre, informado e inequívoco;
·
Informação
pré-contratual clara e acessível;
·
Direito
de arrependimento (14 dias, salvo excepções);
·
Proibição
de cláusulas abusivas e práticas comerciais desleais.
8.4. Protecção
de Dados Pessoais dos Turistas
O
turismo digital implica o tratamento intensivo de dados pessoais: nomes,
contactos, localização, preferências, dados bancários, documentos de
identificação, entre outros.
a)
Aplicação do RGPD
O Regulamento
(UE) 2016/679 (RGPD) aplica-se a todos os operadores turísticos que
tratem dados de residentes na UE, incluindo:
· Estabelecimentos hoteleiros;
· Agências de viagens;
· Plataformas de reservas;
· Transportadoras e operadores turísticos.
b) Princípios fundamentais
· Licitude, lealdade e transparência;
· Minimização dos dados;
· Limitação da finalidade;
· Segurança e confidencialidade.
c) Direitos dos titulares
· Acesso, rectificação, apagamento;
· Portabilidade dos dados;
· Oposição ao tratamento;
· Reclamação junto da CNPD.
8.5. Obrigações dos Operadores Turísticos
Os
operadores turísticos devem cumprir várias obrigações legais em matéria de protecção
de dados:
·
Nomeação
de encarregado de protecção de dados (DPO), quando aplicável;
·
Realização
de avaliações de impacto (DPIA) em projectos de grande escala;
·
Celebração
de contratos com subcontratantes com cláusulas específicas;
·
Notificação
de violações de dados à CNPD e aos titulares.
A não
conformidade pode resultar em coimas até 20 milhões de euros ou 4% do volume de
negócios anual global.
8.6.
Cibersegurança no Turismo
A
cibersegurança é um elemento crítico na protecção dos dados dos turistas e na
integridade dos sistemas digitais utilizados no sector.
a) Riscos principais
·
Ataques
de ransomware a sistemas de reservas;
·
Phishing
dirigido a turistas e operadores;
·
Exposição
indevida de dados sensíveis;
·
Interrupção
de serviços digitais essenciais.
b) Medidas de protecção
· Encriptação de dados;
· Autenticação multifactor;
·
Monitorização
de acessos e actividades suspeitas;
·
Formação
dos colaboradores em segurança digital.
A Directiva
(UE) 2022/2555 - NIS2 reforça as obrigações de cibersegurança para
operadores de serviços essenciais, incluindo o sector turístico.
8.7.
Inteligência Artificial e Personalização Turística
A
utilização de algoritmos e inteligência artificial (IA) permite personalizar
ofertas, prever comportamentos e optimizar operações.
Contudo,
levanta questões éticas e jurídicas:
· Transparência dos algoritmos;
·
Prevenção
de discriminação e enviesamento;
· Consentimento para decisões automatizadas;
·
Responsabilidade
por erros ou falhas algorítmicas.
A Proposta
de Regulamento Europeu sobre IA (AI Act) poderá impactar directamente
o sector turístico, impondo obrigações específicas para sistemas de alto risco.
8.8.
Ética Digital no Turismo
A
digitalização do turismo não é apenas uma questão técnica mas também uma
questão ética. A forma como os dados são recolhidos, tratados e utilizados afecta
directamente a dignidade, a privacidade e a autonomia dos turistas.
a) Princípios éticos fundamentais
·
Consentimento informado: o turista deve saber exactamente o que está a autorizar;
·
Finalidade legítima: os dados devem ser usados apenas para os fins comunicados;
·
Transparência algorítmica: os sistemas de recomendação e personalização devem ser auditáveis;
·
Não discriminação: os algoritmos não devem reproduzir preconceitos ou excluir grupos
vulneráveis.
b)
Responsabilidade social das plataformas
As
grandes plataformas turísticas devem assumir compromissos éticos, como:
·
Publicar
relatórios de impacto digital;
·
Adoptar
códigos de conduta sobre privacidade e segurança;
·
Garantir
acessibilidade digital para todos os públicos.
8.9.
Turismo Digital e Inclusão
A
digitalização pode ser uma ferramenta de inclusão — ou de exclusão, se não for
bem regulada. O Direito deve garantir que todos os cidadãos, independentemente
da idade, literacia digital ou condição económica, possam aceder aos serviços
turísticos digitais.
a) Obrigações de acessibilidade
·
Websites
e aplicações devem cumprir normas de acessibilidade digital (WCAG);
·
Interfaces
devem ser intuitivas, multilingues e compatíveis com tecnologias assistivas;
·
Operadores
devem disponibilizar canais alternativos de reserva e informação.
b)
Literacia digital do turista
O
Estado e os operadores devem promover a literacia digital, com:
·
Guias
práticos sobre segurança online;
·
Formação
em protecção de dados;
·
Apoio
técnico em pontos de informação turística.
8.10.
Jurisprudência Relevante
A
jurisprudência portuguesa e europeia tem vindo a consolidar a proteção dos
turistas em ambiente digital:
·
CNPD, Deliberação n.º 1495/2022: sancionou uma plataforma turística por recolha
excessiva de dados sem base legal;
·
TJUE, Acórdão Schrems II (C-311/18): invalidou o Privacy Shield, afetando
transferências internacionais de dados por plataformas turísticas;
·
Tribunal da Relação de Lisboa, 2023: reconheceu o direito à indemnização por falha de
segurança num sistema de reservas que expôs dados bancários.
Estes
casos mostram que a protecção jurídica do turista digital é uma realidade viva
e em evolução.
8.11.
Propostas de Reforma e Tendências Futuras
Para
reforçar a confiança digital no sector turístico, propõem-se:
·
Criação
de um selo de conformidade digital para operadores turísticos;
·
Obrigatoriedade
de auditorias externas de cibersegurança em plataformas com
grande volume de dados;
·
Inclusão
da protecção de dados e ética digital nos currículos das
escolas de turismo;
·
Incentivos
fiscais para investimentos em infra-estruturas digitais seguras e
acessíveis.
A
tendência é clara: o turismo digital será cada vez mais regulado, auditado e
responsabilizado.
8.12.
Encerramento
O
turismo digital é uma realidade irreversível mas não inevitavelmente opaca ou
perigosa. Com regulação adequada, ética aplicada e literacia reforçada, é
possível construir um ecossistema turístico digital que seja seguro,
transparente e inclusivo.
O
Direito tem aqui um papel decisivo: proteger o turista como cidadão digital,
garantir a responsabilidade dos operadores e promover uma cultura de confiança
e respeito. Este capítulo é um convite à construção de um turismo digital com
rosto humano onde a tecnologia serve, e nunca substitui, os valores
fundamentais da dignidade, da liberdade e da privacidade.
Epílogo
O
Turismo Digital como Espaço de Liberdade e Risco
A
digitalização do turismo criou um espaço de liberdade onde o turista pode
explorar, reservar e experienciar com autonomia. Mas essa liberdade vem
acompanhada de riscos como perda de privacidade, manipulação algorítmica,
dependência de plataformas globais. O Direito deve ser o guardião desse
equilíbrio, protegendo o turista sem sufocar a inovação.
O
Jurista como Arquitecto da Confiança Digital
O
jurista que actua no turismo digital não é apenas um técnico mas também um arquitecto
da confiança. Ele constrói pontes entre tecnologia e ética, entre
inovação e segurança, entre eficiência e dignidade.
A sua actuação exige:
·
Conhecimento
profundo do RGPD e da legislação digital europeia;
·
Capacidade
de interpretar contratos electrónicos com sensibilidade ao consumidor;
·
Visão
crítica sobre os limites da inteligência artificial e da automação.
O
Direito como ferramenta de democratização digital
O
turismo digital pode ser inclusivo se o Direito garantir acessibilidade,
literacia e protecção. Pode ser transparente se o Direito exigir prestação de
contas das plataformas. Pode ser seguro se o Direito responsabilizar quem
falha. Em suma, o Direito é a ferramenta que transforma o potencial
tecnológico em realidade justa.
Perspectiva
de futuro
Nos
próximos anos, o turismo digital será moldado por:
·
Regulação da inteligência artificial aplicada à personalização de experiências;
·
Protecção contra práticas comerciais manipulativas em ambientes digitais;
·
Fiscalização transfronteiriça de plataformas globais;
·
Reconhecimento do turista como sujeito de direitos digitais, com garantias reforçadas.
Portugal,
como destino turístico de referência, tem a oportunidade de liderar este
processo com legislação inovadora, fiscalização eficaz e formação jurídica
especializada.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também é uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o turismo digital. Um convite à
responsabilidade, à criatividade e à coragem. Um lembrete de que a tecnologia
deve servir o humano e nunca o contrário.
Bibliografia:
· PINTO, J. (2020). RGPD e Direito Digital. Lisboa: Edições Sílabo.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Comissão
Europeia. (2022). Guia sobre a Lei dos Serviços Digitais.
· Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD).
·
Decreto-Lei
n.º 24/2014, de 14 de Fevereiro (Contratos à distância).
· Regulamento (UE) 2022/2065 (DSA).
· Diretiva (UE) 2022/2555 (NIS2).
·
Proposta
de Regulamento Europeu sobre IA (AI Act).
·
Jurisprudência
da CNPD e dos tribunais administrativos sobre protecção de dados.
Capítulo 9
Fiscalidade no
Turismo
9.1. Introdução: A importância da
fiscalidade no sector turístico
A fiscalidade é um dos pilares da regulação económica do
turismo. Para além de ser fonte de receita pública, a tributação influencia a
competitividade dos destinos, a formalização dos operadores e a sustentabilidade
dos modelos de negócio. Em Portugal, o sector turístico está sujeito a um
conjunto diversificado de tributos, que variam consoante a natureza da actividade,
o regime jurídico do operador e a localização do empreendimento.
Este capítulo analisa os principais impostos aplicáveis
ao turismo, os regimes especiais, os incentivos fiscais e os desafios
emergentes, como a tributação de plataformas digitais e o controlo do
alojamento local.
9.2. Impostos aplicáveis às actividades
turísticas
a) Imposto sobre o Valor Acrescentado
(IVA)
O IVA é o imposto mais relevante no sector turístico,
incidindo sobre:
- Prestação de serviços de alojamento, restauração e
bebidas;
- Organização de viagens e excursões;
- Aluguer de veículos e equipamentos turísticos.
As
taxas aplicáveis são:
|
Tipo
de serviço |
Taxa
de IVA (Continente) |
|
Alojamento turístico |
6% |
|
Restauração e bebidas |
13% |
|
Serviços de agência de viagens |
23% |
A taxa reduzida de 6% para alojamento visa promover a
acessibilidade e a competitividade do sector.
b) Imposto sobre o Rendimento das
Pessoas Singulares (IRS)
Aplica-se aos empresários em nome individual e aos
titulares de rendimentos provenientes de actividades turísticas, como:
- Alojamento local;
- Guias turísticos;
- Prestadores de serviços turísticos independentes.
Estes rendimentos podem ser tributados:
- Pelo regime simplificado (coeficiente de 0,35 para
prestação de serviços);
- Pelo regime de contabilidade organizada.
c) Imposto sobre o Rendimento das
Pessoas Colectivas (IRC)
Aplica-se às empresas turísticas, incluindo hotéis,
agências de viagens, operadores turísticos e plataformas digitais com sede ou
estabelecimento estável em Portugal.
A taxa normal de IRC é de 21%, podendo ser acrescida de
derramas municipais e estaduais.
9.3. Tributação do Alojamento Local
O alojamento local tem sido objecto de atenção fiscal e
legislativa, dada a sua expansão e impacto urbano.
a) Regime fiscal
- Os rendimentos são tributados em sede de IRS ou IRC,
consoante o tipo de titular;
- O coeficiente aplicável no regime simplificado é de
0,35;
- O IVA é devido quando o volume de negócios
ultrapassa os limites legais.
b) Obrigações acessórias
- Emissão de facturas com número de contribuinte;
- Comunicação mensal à Autoridade Tributária;
- Inscrição no Registo Nacional do Alojamento Local
(RNAL).
c) Fiscalização
A AT, a ASAE e os municípios têm competências para
fiscalizar o cumprimento das obrigações fiscais e administrativas, podendo
aplicar coimas e sanções acessórias.
9.4. Incentivos Fiscais ao Investimento
Turístico
O Estado português disponibiliza diversos incentivos
fiscais para promover o investimento sustentável e a qualificação da oferta
turística:
a) SIFIDE (Sistema de Incentivos
Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial)
Permite deduzir à colecta de IRC despesas com inovação e
desenvolvimento de produtos turísticos.
b) RFAI (Regime Fiscal de Apoio ao
Investimento)
Concede benefícios fiscais a projectos turísticos em
zonas de baixa densidade, incluindo:
- Dedução à colecta de IRC;
- Isenção de IMI e IMT;
- Redução de taxas de IVA em certos serviços.
c) Incentivos regionais
Algumas regiões autónomas e municípios oferecem
benefícios fiscais específicos, como isenção de taxas municipais ou apoio à
reabilitação urbana.
9.5. Fiscalidade Verde e Turismo
Sustentável
A fiscalidade pode ser usada como instrumento de promoção
da sustentabilidade no sector turístico:
- Redução de taxas para empreendimentos com
certificação ambiental;
- Majoração de benefícios fiscais para projectos de
turismo de natureza;
- Penalização fiscal para actividades com elevado
impacto ambiental.
Exemplo: O Programa Valorizar inclui linhas de apoio com
benefícios fiscais para projectos que promovam a eficiência energética e a
gestão sustentável de recursos.
9.6. Economia Digital e Tributação de
Plataformas
A tributação das plataformas digitais que operam no sector
turístico é um desafio crescente, especialmente quando estas não têm sede em
Portugal.
a) Estabelecimento estável
A AT pode considerar que existe estabelecimento estável
em Portugal se a plataforma tiver presença física ou actividade económica
significativa.
b) Cooperação internacional
Portugal participa em iniciativas da OCDE e da UE para
garantir a tributação justa da economia digital, como:
- Projector BEPS (Base Erosion
and Profit Shifting);
- Directiva sobre tributação mínima global;
- Proposta de imposto sobre serviços digitais.
9.7. Obrigações fiscais dos operadores
turísticos
Todos os operadores turísticos devem cumprir obrigações
fiscais regulares:
- Registo na AT e obtenção de número de contribuinte;
- Emissão de facturas e recibos;
- Entrega de declarações periódicas de IVA, IRS ou
IRC;
- Pagamento de contribuições para a Segurança Social.
O incumprimento pode resultar em coimas, juros
compensatórios, reversão de benefícios fiscais e responsabilidade subsidiária
dos administradores.
Bibliografia:
- MARTINS, A. (2021). Fiscalidade Aplicada ao
Turismo. Porto: Vida Económica.
- FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
- Código do IRS, Código do IRC, Código do IVA.
- Decreto-Lei n.º 128/2014, de 29 de Agosto
(Alojamento Local).
- Portaria n.º 233/2022, de 9 de Setembro (Incentivos
fiscais ao investimento).
- Relatórios da Autoridade Tributária e do Turismo de
Portugal.
- OCDE. (2021). Relatório sobre Tributação da
Economia Digital.
Epílogo
A
Fiscalidade como Instrumento de Política Turística
A
fiscalidade não é apenas um mecanismo de arrecadação é um instrumento
de política pública que pode orientar o desenvolvimento turístico em direcção
à sustentabilidade, à coesão territorial e à inovação.
Quando
bem desenhada, a política fiscal:
· Estimula o investimento responsável;
·
Penaliza
práticas predatórias ou informais;
·
Promove
a redistribuição dos benefícios do turismo;
·
Reforça
a transparência e a confiança no sector.
O
Jurista como Intérprete da Justiça Fiscal
O
jurista que actua no sector turístico deve ser mais do que um técnico
tributário deve ser um intérprete
da justiça fiscal, capaz de:
·
Identificar
distorções e assimetrias no sistema;
·
Propor
soluções normativas que respeitem a equidade e a proporcionalidade;
·
Defender
os direitos dos operadores e dos consumidores perante a Administração
Tributária;
·
Promover
uma cultura de conformidade e responsabilidade.
Fiscalidade
e Sustentabilidade: Uma Aliança Estratégica
A
integração entre fiscalidade e sustentabilidade é uma tendência irreversível.
O
futuro da tributação turística passa por:
·
Bonificações fiscais para práticas ecológicas e sociais;
·
Tributação diferenciada por impacto ambiental;
·
Incentivos à economia circular e à mobilidade suave;
·
Fiscalidade verde como critério de licenciamento e financiamento.
Esta
aliança exige uma revisão profunda dos códigos fiscais, com inclusão de
indicadores ambientais e sociais nos regimes tributários.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, a fiscalidade turística será moldada por:
·
A digitalização
da administração fiscal, com cruzamento de dados em tempo real;
·
A tributação
da economia colaborativa, com regras claras para plataformas como
Airbnb e Uber;
·
A fiscalidade
internacional, com acordos multilaterais para evitar dupla tributação
e evasão fiscal;
·
A fiscalidade
comportamental, que orienta escolhas dos consumidores e dos
operadores.
Portugal
tem a oportunidade de liderar este processo, com uma abordagem fiscal
inovadora, justa e alinhada com os objectivos de desenvolvimento sustentável.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma exposição técnica mas também é uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a fiscalidade turística. Um convite à
responsabilidade, à criatividade e à justiça. Um lembrete de que o turismo,
para ser verdadeiramente transformador, deve ser também fiscalmente ético,
transparente e sustentável.
Capítulo 10
Turismo e Direito do Trabalho
10.1.
Introdução: A centralidade do trabalho no sector turístico
O
turismo é um dos sectores mais intensivos em mão de obra, envolvendo uma vasta
gama de profissões: recepcionistas, guias turísticos, cozinheiros, empregados
de mesa, gestores de alojamento, técnicos de animação, entre outros. A
qualidade do serviço turístico depende directamente das condições de trabalho,
da formação e da valorização dos profissionais.
Este
capítulo analisa o enquadramento jurídico-laboral do sector turístico em
Portugal, os regimes contratuais, os direitos dos trabalhadores, os desafios da
precariedade e da sazonalidade, e as novas formas de trabalho digital.
10.2.
Regimes Contratuais no Turismo
a)
Contrato de trabalho a termo
·
Muito
comum em actividades sazonais (verão, festividades, eventos);
·
Regulado
pelo Código do Trabalho (artigos 140.º a 149.º);
·
Deve
ser fundamentado em necessidade temporária e não pode exceder os limites legais
de renovação.
b)
Contrato de trabalho sem termo
·
Preferencial
em unidades hoteleiras e operadores turísticos com actividade contínua;
·
Garante
maior estabilidade e protecção social ao trabalhador.
c)
Contrato de trabalho a tempo parcial
·
Utilizado
em serviços com horários irregulares ou de baixa intensidade;
·
Deve
respeitar os princípios da proporcionalidade e da não discriminação.
d)
Contrato de prestação de serviços
·
Aplicável
a profissionais independentes (guias, animadores, tradutores);
·
Não
confere vínculo laboral, mas exige cumprimento das obrigações fiscais e
contributivas.
10.3.
Direitos dos Trabalhadores Turísticos
Os
trabalhadores do sector turístico têm direito a:
·
Remuneração justa, incluindo salário base, subsídios e gratificações;
·
Horário de trabalho compatível com a vida pessoal, com limites legais e compensações por
trabalho nocturno ou em feriados;
·
Descanso semanal e férias pagas, nos termos do Código do Trabalho;
·
Protecção contra despedimento abusivo, com direito a indemnização e reintegração;
·
Formação profissional contínua, promovida pelo empregador ou por entidades
públicas;
·
Segurança e saúde no trabalho, com equipamentos adequados e prevenção de
riscos.
10.4.
Sazonalidade e Precariedade
A
sazonalidade é uma característica estrutural do turismo, especialmente em
regiões balneares, rurais ou de eventos.
Esta
realidade gera desafios jurídicos:
·
Contratos de curta duração, com menor protecção social;
·
Descontinuidade de rendimentos, dificultando o acesso a crédito, habitação e
estabilidade familiar;
·
Dependência de subsídios de desemprego, em períodos de baixa actividade.
Propostas de mitigação incluem:
·
Criação
de regimes contributivos flexíveis, adaptados à sazonalidade;
·
Incentivos
à pluriactividade profissional e à reconversão em épocas
baixas;
·
Promoção
de turismo fora da época alta, para estabilizar o emprego.
10.5.
Trabalho Digital e Plataformas Turísticas
A
digitalização do turismo criou novas formas de trabalho, muitas vezes fora do enquadramento
tradicional:
a) Plataformas de serviços turísticos
·
Guias,
motoristas, anfitriões de alojamento local operam através de plataformas como
Airbnb, Viator, Uber;
·
Relação
jurídica ambígua: trabalhador, prestador independente ou parceiro comercial?
b) Teletrabalho e gestão remota
·
Utilizado
por profissionais de reservas, marketing, gestão de redes sociais;
·
Regulado
pelo Código do Trabalho (artigos 165.º-A a 165.º-G), com direitos específicos
de desconexão, equipamentos e despesas.
c) Riscos jurídicos
· Falta de protecção social;
· Dificuldade de fiscalização;
· Ausência de representação sindical.
10.6. Formação e Qualificação Profissional
A
valorização dos trabalhadores turísticos depende da formação contínua e da
certificação de competências:
·
Turismo de Portugal oferece programas de formação em hotelaria, restauração, animação e
gestão;
·
IEFP promove
cursos técnicos e reconversão profissional;
·
Certificação de competências permite reconhecer experiência adquirida fora do sistema formal.
A
formação deve incluir conteúdos sobre:
· Sustentabilidade e responsabilidade social;
· Ética profissional e hospitalidade;
·
Literacia
digital e segurança de dados.
10.7.
Representação Coletiva e Negociação
Os
trabalhadores turísticos têm direito à representação sindical e à negociação colectiva:
·
Sindicatos
do sector hoteleiro, da restauração e do turismo actuam na defesa dos direitos
laborais;
·
A
negociação colectiva permite melhorar condições salariais, horários e
benefícios;
·
A
contratação colectiva é especialmente relevante em grandes cadeias hoteleiras e
operadores turísticos.
10.8.
Trabalho Temporário e Subcontratação
O
recurso ao trabalho temporário e à subcontratação é frequente no sector
turístico, especialmente em épocas de maior afluência.
a) Trabalho temporário
·
Regulado
pelo Código do Trabalho (artigos 172.º a 179.º);
·
Envolve
três partes: trabalhador, empresa de trabalho temporário e empresa utilizadora;
·
Deve
respeitar os limites de duração e fundamentação legal.
b) Subcontratação
·
Utilizada
em serviços de limpeza, segurança, animação e restauração;
·
Exige
cláusulas claras nos contratos de prestação de serviços;
·
O
empregador principal pode ser responsabilizado solidariamente por violações
laborais.
10.9.
Igualdade e Não Discriminação
O sector
turístico deve promover a igualdade de oportunidades e combater todas as formas
de discriminação laboral.
a) Princípios legais
·
Artigo
24.º do Código do Trabalho: proibição de discriminação em função de sexo,
idade, origem, religião, deficiência, orientação sexual;
·
Obrigação
de garantir igualdade salarial para trabalho igual ou de valor igual.
b) Medidas práticas
·
Formação
em diversidade e inclusão;
·
Adopção
de códigos de conduta ética;
·
Criação
de canais de denúncia e protecção contra assédio.
10.10.
Saúde Mental e Bem-Estar no Trabalho Turístico
O
trabalho no sector turístico pode ser exigente e emocionalmente desgastante,
devido ao contacto constante com o público, à pressão horária e à instabilidade
contratual.
a) Riscos psicossociais
· Burnout, ansiedade, stress laboral;
·
Conflitos
interpessoais e assédio moral;
·
Dificuldade
de conciliação entre vida profissional e pessoal.
b) Respostas jurídicas e organizacionais
·
Avaliação
de riscos psicossociais nos locais de trabalho;
·
Promoção
de ambientes saudáveis e apoio psicológico;
·
Direito
à desconexão digital, especialmente em funções remotas.
10.11.
Jurisprudência Relevante
A
jurisprudência portuguesa tem vindo a consolidar os direitos dos trabalhadores
turísticos:
·
TRP, Acórdão de 12.05.2022: reconheceu vínculo laboral entre guia turístico e agência, apesar de
contrato de prestação de serviços;
·
TRL, Acórdão de 03.11.2023: condenou hotel por despedimento ilícito de trabalhador com contrato a
termo sucessivamente renovado sem fundamento;
·
TC, Acórdão n.º 268/2021: reafirmou o princípio da igualdade salarial entre homens e mulheres em
funções turísticas.
10.12.
Propostas de Reforma e Tendências Futuras
Para
reforçar a justiça laboral no sector turístico, propõem-se:
·
Criação
de um Estatuto do Trabalhador Turístico, com direitos
específicos adaptados à sazonalidade e à digitalização;
·
Reforço
da fiscalização laboral em alojamentos locais e plataformas
digitais;
·
Incentivos
à contratação sem termo e à formação contínua;
·
Promoção
de certificações sociais para empresas que respeitem boas
práticas laborais.
Encerramento
O
turismo é feito de pessoas e o Direito do Trabalho é o instrumento que garante
que essas pessoas são respeitadas, valorizadas e protegidas. Este capítulo
mostrou que a qualidade turística começa na dignidade laboral, e que o jurista
tem um papel essencial na construção de um sector mais justo, inclusivo e
sustentável.
Epílogo
O
Trabalho como Pilar da Qualidade Turística
A
experiência turística é profundamente humana. Por trás de cada recepção
calorosa, cada prato servido com cuidado, cada visita guiada com paixão, está o
trabalho de profissionais que dão vida ao sector. A qualidade do turismo
depende da qualidade do trabalho e essa qualidade só é
possível com dignidade, formação, estabilidade e reconhecimento.
O
Jurista como Guardião da Justiça Laboral
O
jurista que actua no sector turístico não é apenas um intérprete da lei mas
também um guardião da justiça laboral.
Deve:
·
Identificar
abusos e precariedades disfarçadas;
·
Promover
contratos justos e equilibrados;
·
Defender
os direitos dos trabalhadores em contextos digitais e informais;
·
Contribuir
para políticas públicas que valorizem o trabalho turístico.
Trabalho
Turístico e Sustentabilidade Social
A
sustentabilidade no turismo não se limita ao ambiente pois inclui também a sustentabilidade
social, que passa pela valorização dos trabalhadores, pela inclusão,
pela equidade e pela protecção dos mais vulneráveis. Um turismo que explora os
seus profissionais não é sustentável mas insustentável por definição.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, o trabalho turístico será moldado por:
·
A automação
de tarefas repetitivas, exigindo reconversão profissional;
·
A expansão
do trabalho em plataformas, com necessidade de regulação clara;
·
A valorização
da hospitalidade como competência emocional, não automatizável;
·
A integração
da ética laboral nos modelos de certificação turística.
Portugal
tem a oportunidade de liderar este processo, com uma abordagem jurídica que
combine inovação, protecção e visão humanista.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas é uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o trabalho turístico. Um convite à
responsabilidade, à empatia e à coragem. Um lembrete de que o turismo, para ser
verdadeiramente transformador, deve começar por respeitar quem o torna
possível: os trabalhadores.
Bibliografia:
·
Código
do Trabalho (Lei n.º 7/2009, com alterações).
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Turismo
de Portugal. (2023). Guia de Boas Práticas Laborais no Turismo.
·
IEFP.
(2022). Relatório sobre Formação Profissional no Setor Turístico.
·
Comissão
Europeia. (2021). Estudo sobre Trabalho em Plataformas Digitais.
·
Jurisprudência
dos tribunais do trabalho sobre contratos a termo e despedimentos no setor
turístico.
Capítulo 11
Turismo, Património Cultural e Direito
11.1.
Introdução: O património como recurso turístico e bem jurídico
O
património cultural é um dos principais activos do turismo em Portugal.
Monumentos, centros históricos, tradições, gastronomia, paisagens culturais e
práticas imateriais atraem milhões de visitantes todos os anos. Contudo, o
património não é apenas um recurso económico mas também um bem jurídico protegido,
com valor histórico, identitário e simbólico.
Este
capítulo analisa o enquadramento legal da relação entre turismo e património cultural,
os instrumentos de protecção, os limites da exploração turística e os desafios
contemporâneos da turistificação e da digitalização.
11.2.
Conceito jurídico de património cultural
O
património cultural abrange:
·
Património imóvel: monumentos, edifícios, sítios arqueológicos e centros históricos;
·
Património móvel: obras de arte, documentos e objectos históricos;
·
Património imaterial: tradições, saberes, festas e práticas culturais;
·
Paisagens culturais: territórios moldados pela interacção entre natureza e cultura.
A Lei
de Bases do Património Cultural (Lei n.º 107/2001) define o património como
“conjunto de bens materiais e imateriais que, pelo seu valor cultural, devem
ser preservados e valorizados”.
11.3.
Instrumentos jurídicos de protecção
a)
Classificação e inventariação
·
Bens
classificados como de interesse nacional, público ou municipal;
·
Inventário
Nacional do Património Cultural;
·
Registo
na UNESCO como Património Mundial.
b) Regime de protecção
·
Intervenções
sujeitas a parecer da Direcção-geral do Património Cultural (DGPC);
·
Proibição
de demolição, descaracterização ou uso incompatível;
·
Zonas
de protecção e áreas de reabilitação urbana.
c) Fiscalização e sanções
·
Coimas
por infracções urbanísticas ou patrimoniais;
·
Responsabilidade
civil e penal por danos ao património;
·
Suspensão
de licenças turísticas em caso de violação das normas de protecção.
11.4.
Turismo cultural e valorização patrimonial
O
turismo pode ser uma ferramenta de valorização do património, desde que
respeite os princípios da autenticidade, da sustentabilidade e da participação
comunitária.
a) Boas práticas
·
Reabilitação
de edifícios históricos para fins turísticos;
·
Criação
de roteiros culturais e experiências interpretativas;
·
Envolvimento
das comunidades locais na gestão e narração do património.
b) Programas públicos
·
Programa
REVIVE: concessão de imóveis públicos para fins turísticos com critérios
patrimoniais;
·
Linhas
de financiamento para turismo cultural e criativo;
·
Parcerias
entre municípios, universidades e operadores turísticos.
11.5.
Conflitos entre conservação e exploração turística
A
valorização turística do património pode gerar tensões jurídicas e éticas:
·
Turistificação:
pressão sobre centros históricos, aumento de rendas, perda de identidade local;
·
Massificação:
degradação física e simbólica dos bens culturais;
·
Comercialização excessiva: banalização de práticas culturais e patrimonialização artificial.
O
Direito deve mediar estes conflitos, garantindo:
·
Limites
à densidade turística em zonas sensíveis;
·
Participação
das comunidades na definição dos usos turísticos;
·
Avaliação
de impacto cultural nos projectos turísticos.
11.6.
Património Imaterial e Turismo
O
património imaterial é especialmente vulnerável à exploração turística,
exigindo protecção jurídica específica:
·
Registo
no Inventário Nacional do Património Imaterial;
·
Reconhecimento
pela UNESCO (ex. Fado, Cantares do Alentejano);
·
Proibição
de apropriação indevida ou descontextualização comercial.
O
turismo deve promover o respeito, a transmissão e a autenticidade das práticas culturais,
evitando a sua mercantilização.
11.7.
Digitalização do património e turismo virtual
A
tecnologia permite novas formas de valorização turística do património:
·
Visitas
virtuais a museus e monumentos;
·
Realidade
aumentada em sítios arqueológicos;
·
Arquivos
digitais e plataformas interactivas.
a) Desafios jurídicos
·
Direitos
de autor sobre conteúdos digitais;
·
Protecção
de dados em experiências imersivas;
·
Responsabilidade
pela curadoria e interpretação digital.
O
Direito deve garantir que a digitalização respeita o valor cultural, a
integridade histórica e os direitos dos criadores.
Epílogo
O
Património como Fundamento da Identidade Turística
O
património cultural não é apenas um atractivo turístico; é o fundamento
da identidade colectiva. Liga passado e presente, território e
comunidade, memória e experiência. O turismo que respeita o património não o
consome, celebra-o, interpreta-o e transmite-o.
O
Direito tem aqui um papel essencial que é o de garantir que essa transmissão se
faz com autenticidade, responsabilidade e justiça.
O
Jurista como Guardião da Integridade Cultural
O
jurista que actua na interface entre turismo e património cultural deve ser um guardião
da integridade cultural.
Deve:
·
Interpretar
normas com sensibilidade histórica e territorial;
·
Mediar
conflitos entre conservação e exploração económica;
·
Propor
soluções jurídicas que respeitem a autenticidade e a participação comunitária;
·
Defender
o património como bem comum, não como mercadoria.
Turismo
Cultural e Sustentabilidade
A
sustentabilidade cultural é um dos pilares do turismo responsável.
Exige:
·
Gestão participativa dos bens culturais;
·
Educação patrimonial dos turistas e operadores;
·
Limitação da carga turística em zonas sensíveis;
·
Redistribuição dos benefícios económicos para as comunidades locais.
O
Direito pode promover essa sustentabilidade através de licenciamento
condicionado, incentivos à conservação e penalizações por uso abusivo.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, a relação entre turismo e património será moldada por:
·
A digitalização
do acesso e da interpretação, com desafios de curadoria e direitos de
autor;
·
A revalorização
do património imaterial, como resposta à homogeneização cultural;
·
A integração
do património nos modelos de certificação turística, como critério de
qualidade;
·
A participação
activa das comunidades na gestão turística, como garantia de
legitimidade.
Portugal,
com a sua riqueza patrimonial e tradição jurídica, tem condições únicas para
liderar este paradigma.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o património turístico. Um convite à
responsabilidade, à sensibilidade e à coragem. Um lembrete de que o turismo,
para ser verdadeiramente transformador, deve começar por respeitar o que nos
liga: o património.
Bibliografia:
·
Lei
n.º 107/2001, de 8 de Setembro (Lei de Bases do Património Cultural).
·
Decreto-Lei
n.º 309/2009, de 23 de Outubro (Classificação e Inventariação).
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
UNESCO.
(2003). Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial.
·
DGPC.
(2022). Guia Jurídico de Proteção do Património Cultural.
·
Programa
REVIVE – Ministério da Economia e do Mar.
·
Jurisprudência
administrativa sobre licenciamento turístico em zonas históricas.
Capítulo 12
Turismo,
Mobilidade e Direito dos Transportes
12.1. Introdução: A mobilidade como infra-estrutura do
turismo
A mobilidade é um elemento estruturante do turismo. Sem
transporte acessível, seguro e eficiente, não há turismo inclusivo nem
competitivo. O Direito dos Transportes, enquanto ramo jurídico especializado,
regula os modos de deslocação dos turistas, os contratos de transporte, os
direitos dos passageiros e as obrigações dos operadores.
Este capítulo analisa os regimes jurídicos aplicáveis à
mobilidade turística em Portugal, com especial atenção à intermodalidade, à
sustentabilidade e à protecção dos consumidores.
12.2. Modos de transporte turístico
a) Transporte rodoviário
- Inclui autocarros turísticos, táxis, veículos TVDE
(Uber, Bolt), auto caravanas e aluguer de viaturas.
- Regulado pelo Código da Estrada, pelo Decreto-Lei
n.º 3/2001 (transporte colectivo de passageiros) e pelo Decreto-Lei n.º
101/2018 (TVDE).
b) Transporte ferroviário
- Inclui comboios regionais, urbanos, turísticos e
históricos (ex. Comboio Histórico do Douro).
- Regulado pelo Decreto-Lei n.º 217/2012 e pela
legislação europeia sobre liberalização do sector ferroviário.
c) Transporte marítimo e fluvial
- Inclui cruzeiros, ferries, barcos turísticos e
passeios fluviais.
- Regulado pelo Código Marítimo Comercial, pela
Convenção SOLAS e pela legislação da Autoridade da Mobilidade e dos
Transportes (AMT).
d) Transporte aéreo
- Inclui voos regulares, charter, low-cost e
helicópteros turísticos.
- Regulado pelo Código da Aviação Civil, pelo
Regulamento (CE) n.º 261/2004 (direitos dos passageiros) e pela Convenção
de Montreal.
12.3. Contrato de transporte turístico
O contrato de transporte turístico é um contrato de
prestação de serviços, com regras específicas consoante o modo de transporte.
a) Elementos essenciais
- Prestação do serviço de deslocação;
- Indicação do percurso, horários e condições;
- Preço e forma de pagamento;
- Responsabilidade por atrasos, cancelamentos e danos.
b) Regime jurídico
- Aplicação do Código Civil (contrato de prestação de
serviços);
- Normas específicas dos regulamentos sectoriais;
- Protecção do consumidor nos termos da Lei n.º 24/96
e do Decreto-Lei n.º 24/2014.
12.4. Direitos dos passageiros
turísticos
Os turistas, enquanto passageiros, têm direitos específicos
consagrados na legislação nacional e europeia:
|
Situação |
Direito
do Passageiro |
Base
Legal |
|
Cancelamento de voo |
Reembolso ou reencaminhamento +
indemnização |
Regulamento (CE) n.º 261/2004 |
|
Atraso superior a 2h |
Assistência (refeições,
alojamento) |
Regulamento (CE) n.º 261/2004 |
|
Perda de bagagem |
Indemnização até 1.300€ |
Convenção de Montreal |
|
Cancelamentode cruzeiro |
Reembolso ou alternativa
equivalente |
Diretiva 2015/2302 (pacotes
turísticos) |
|
Falta de acessibilidade |
Direito à assistência e adaptação do serviço |
Regulamento (UE) n.º 181/2011 |
12.5. Mobilidade sustentável e turismo
A mobilidade turística deve alinhar-se com os princípios
da sustentabilidade ambiental, social e económica.
a) Práticas sustentáveis
- Promoção do transporte público e colectivo;
- Incentivo à mobilidade suave (bicicletas, caminhadas);
- Utilização de veículos eléctricos e híbridos;
- Planeamento urbano com acessos turísticos
integrados.
b) Instrumentos jurídicos
- Plano Nacional de Mobilidade Sustentável;
- Estratégia Turismo 2027;
- Regulamentos municipais de circulação e
estacionamento.
12.6. Intermodalidade e integração de
serviços
A intermodalidade é essencial para uma experiência
turística fluida e eficiente.
a) Conceito
- Integração de diferentes modos de transporte
(comboio + autocarro + barco);
- Bilhética única e digital;
- Coordenação de horários e percursos.
b) Regulação
- Competência da Autoridade da Mobilidade e dos
Transportes (AMT);
- Projectos como o Navegante, o Andante e o SIGA;
- Incentivos à interoperabilidade tecnológica e
tarifária.
12.7. Turismo acessível e mobilidade
inclusiva
A mobilidade turística deve ser acessível a todos,
incluindo pessoas com deficiência, mobilidade reduzida, idosos e famílias com
crianças.
a) Obrigações legais
- Normas de acessibilidade nos transportes públicos;
- Formação dos operadores em atendimento inclusivo;
- Informação clara e multiformato (visual, auditiva, táctil).
b) Boas práticas
- Transporte adaptado em zonas turísticas;
- Guias turísticos com formação em acessibilidade;
- Plataformas digitais com funcionalidades inclusivas.
Epílogo
A
Mobilidade como Direito Turístico Fundamental
A
mobilidade não é apenas um meio; é um direito turístico fundamental.
Sem acesso equitativo aos transportes, o turismo torna-se excludente,
fragmentado e insustentável. O Direito deve garantir que todos os turistas,
independentemente da sua condição física, económica ou geográfica, possam
deslocar-se com segurança, dignidade e liberdade.
O
Jurista como Mediador da Mobilidade Justa
O
jurista que atua na interface entre turismo e transportes deve ser um mediador
da mobilidade justa.
Deve:
·
Interpretar
normas com sensibilidade social e territorial;
·
Defender
os direitos dos passageiros perante operadores e autoridades;
·
Promover
contratos equilibrados e acessíveis;
·
Propor
soluções jurídicas que integrem sustentabilidade, inovação e inclusão.
Mobilidade
Sustentável como Pilar do Turismo Responsável
A
mobilidade sustentável é um dos pilares do turismo responsável.
Exige:
·
Planeamento
urbano e territorial com foco na acessibilidade turística;
·
Incentivos
à utilização de transportes colectivos e não poluentes;
·
Regulação
eficaz das plataformas digitais de transporte;
·
Educação
dos turistas sobre escolhas de mobilidade com menor pegada ecológica.
O
Direito pode catalisar essa transição através de licenciamento condicionado,
fiscalidade verde e normas de interoperabilidade.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, a mobilidade turística será moldada por:
·
A automação
e inteligência artificial na gestão de fluxos turísticos;
·
A integração
de bilhética digital e serviços multimodais;
·
A regulação
das plataformas de mobilidade partilhada, com foco na equidade;
·
A valorização
da mobilidade lenta e experiencial, como parte da oferta turística.
Portugal
tem a oportunidade de liderar este processo, com uma abordagem jurídica que
combine inovação, sustentabilidade e justiça territorial.
Legado
do Capítulo
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa; é uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a mobilidade turística. Um convite à
responsabilidade, à criatividade e à visão estratégica. Um lembrete de que o
turismo, para ser verdadeiramente transformador, deve começar por garantir que
todos podem chegar e que o caminho é tão importante quanto o destino.
Bibliografia:
- Código da Estrada e Código da Aviação Civil.
- Decreto-Lei n.º 101/2018 (TVDE).
- Regulamento (CE) n.º 261/2004 (Direitos dos
Passageiros Aéreos).
- Convenção de Montreal (1999).
- Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (Defesa do
Consumidor).
- Estratégia Turismo 2027 - Turismo de Portugal.
- AMT – Relatórios sobre mobilidade turística e
intermodalidade.
- FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
Capítulo 13
Turismo, Urbanismo e Direito do Ordenamento do Território
13.1.
Introdução: O território como palco do turismo
O
turismo não acontece no abstracto mas ocupa espaço, transforma paisagens, afecta
ecossistemas e comunidades. O ordenamento do território é, por isso, um
instrumento essencial para garantir que o turismo se desenvolve de forma
equilibrada, sustentável e juridicamente legítima.
Este
capítulo analisa os principais instrumentos de ordenamento aplicáveis ao
turismo em Portugal, os regimes de licenciamento urbanístico, os conflitos
entre uso turístico e funções residenciais, e os desafios contemporâneos da
turistificação, da gentrificação e da pressão imobiliária.
13.2.
Instrumentos de gestão territorial aplicáveis ao turismo
a) Regime jurídico
·
Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n.º 31/2014);
·
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) – Decreto-Lei n.º 80/2015;
·
Planos Directores Municipais (PDM), Planos de Urbanização (PU) e Planos
de Pormenor (PP).
b) Compatibilidade de usos
·
Os
empreendimentos turísticos devem respeitar os usos definidos nos planos
territoriais;
·
A afectação
do solo (urbano, rústico, protegido) condiciona a viabilidade do projecto;
·
A
reconversão de edifícios existentes exige compatibilidade com os parâmetros
urbanísticos.
13.3.
Licenciamento urbanístico de empreendimentos turísticos
a)
Procedimentos legais
·
Pedido
de informação prévia (PIP);
·
Licenciamento
de obras de construção, reconstrução ou alteração;
·
Autorização
de utilização para fins turísticos.
b) Entidades competentes
· Câmaras Municipais;
·
Comissões
de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR);
·
Direcção-geral
do Território (DGT);
·
Turismo
de Portugal (em casos de projectos PIN ou de interesse nacional).
c) Requisitos técnicos e legais
·
Índices
de construção, volumetria, cércea;
· Acessibilidade, estacionamento, infra-estruturas;
· Impacto ambiental e paisagístico.
13.4. Reabilitação urbana e turismo
A
reabilitação de edifícios para fins turísticos é uma prática crescente,
especialmente em centros históricos.
a) Regime jurídico
·
Regime Jurídico da Reabilitação Urbana (RJRU) - Decreto-Lei n.º 307/2009;
·
Criação
de Áreas de Reabilitação Urbana (ARU) e Sociedades de
Reabilitação Urbana (SRU);
·
Benefícios
fiscais e simplificação de procedimentos.
b) Conflitos e tensões
·
Pressão
sobre o mercado habitacional;
· Descaracterização do tecido urbano;
· Exclusão das comunidades residentes.
13.5. Turistificação e gentrificação
A turistificação
é o processo de transformação de zonas urbanas em espaços predominantemente
turísticos, com impactos sociais e territoriais relevantes.
a) Efeitos jurídicos e sociais
·
Aumento
de rendas e expulsão de residentes;
·
Substituição
de comércio tradicional por serviços turísticos;
·
Perda
de identidade e função social do espaço urbano.
b) Respostas jurídicas
·
Limitação
do número de alojamentos locais por freguesia;
·
Criação
de zonas de contenção turística;
·
Revisão
dos PDM com critérios de equilíbrio funcional.
13.6.
Turismo em solo rural e protegido
O
desenvolvimento turístico em áreas rurais, naturais ou protegidas exige
especial atenção jurídica.
a) Regime jurídico
·
Rede Natura 2000, Parques Naturais, Áreas de Paisagem Protegida;
·
Necessidade
de pareceres vinculativos do ICNF;
·
Avaliação
de impacte ambiental (AIA) obrigatória em certos casos.
b) Compatibilidade com valores ecológicos
·
Turismo
de natureza, ecoturismo, agro-turismo;
·
Limites
à construção e à densidade;
·
Promoção
de modelos de baixo impacto e integração paisagística.
13.7. Jurisprudência relevante
·
TRL, Acórdão de 15.03.2022: anulou licença de empreendimento turístico em zona de protecção
paisagística por violação do PDM;
·
TCAS, Acórdão de 07.07.2023: confirmou legalidade de zona de contenção de alojamento local em Lisboa;
·
STA, Acórdão de 12.10.2021: reconheceu direito de associação de moradores a impugnar licenciamento
turístico por falta de consulta pública.
Epílogo
O
Território como Espelho da Política Turística
O
território não é apenas um suporte físico; é um espelho das escolhas
políticas e jurídicas que moldam o turismo. Cada empreendimento
turístico é uma decisão sobre o uso do espaço, sobre quem pertence, quem
beneficia e quem é excluído. O Direito do Ordenamento do Território é, por
isso, um instrumento de justiça espacial.
O
Jurista como Curador do Espaço Turístico
O
jurista que actua na interface entre turismo e urbanismo deve ser um curador
do espaço turístico.
Deve:
·
Interpretar
planos e normas com sensibilidade ecológica e social;
·
Mediar
conflitos entre interesses económicos e direitos territoriais;
·
Propor
soluções jurídicas que respeitem a identidade dos lugares;
·
Defender
o território como bem comum, não como mercadoria.
Urbanismo
Turístico e Sustentabilidade Territorial
A
sustentabilidade territorial exige que o turismo:
·
Respeite
os limites ecológicos e urbanísticos;
·
Valorize
o património construído e natural;
·
Promova
a coesão social e a inclusão espacial;
·
Evite
a monocultura turística e a turistificação agressiva.
O
Direito pode catalisar essa sustentabilidade através de zonamento inteligente,
licenciamento ético e participação cidadã.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, o ordenamento turístico será moldado por:
·
A integração
entre planeamento urbano e estratégias turísticas;
·
A regulação
da densidade turística em zonas sensíveis;
·
A digitalização
dos processos de licenciamento e fiscalização;
·
A valorização
da arquitectura vernacular e da paisagem cultural como activos
turísticos.
Portugal
tem a oportunidade de liderar este processo, com uma abordagem jurídica que
combine inovação, memória e justiça territorial.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa; é uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o território turístico. Um convite à
responsabilidade, à sensibilidade e à coragem. Um lembrete de que o turismo,
para ser verdadeiramente transformador, deve começar por respeitar o espaço que
o acolhe e as pessoas que nele vivem.
Bibliografia:
·
Lei
n.º 31/2014, de 30 de Maio (Bases do Ordenamento do Território).
·
Decreto-Lei
n.º 80/2015, de 14 de Maio (RJIGT).
·
Decreto-Lei
n.º 307/2009, de 23 de Outubro (RJRU).
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Direção-Geral
do Território. (2022). Guia Técnico de Planeamento Turístico.
·
Jurisprudência
administrativa e urbanística sobre licenciamento turístico.
·
Relatórios
da CCDR e do ICNF sobre compatibilidade territorial.
Capítulo 14
Turismo, Segurança e Direito Público
14.1.
Introdução: A segurança como condição da experiência turística
A
segurança é um pré-requisito da actividade turística. Sem garantias mínimas de protecção
física, sanitária, jurídica e institucional, o turismo não se realiza
plenamente. O Direito Público tem a responsabilidade de assegurar que os
turistas nacionais e estrangeiros possam usufruir do território com confiança,
previsibilidade e protecção.
Este
capítulo analisa os regimes jurídicos aplicáveis à segurança turística, os
direitos dos turistas em situações de emergência, o papel das autoridades
públicas e os desafios contemporâneos como pandemias, terrorismo, desastres
naturais e cibersegurança.
14.2.
Direitos fundamentais dos turistas
Os
turistas, enquanto cidadãos e consumidores, beneficiam de um conjunto de
direitos fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa e em
instrumentos internacionais:
· Direito à vida e à integridade física (art. 24.º CRP);
· Direito à protecção da saúde (art. 64.º CRP);
·
Direito à informação e assistência consular (Convenção de Viena sobre Relações Consulares);
·
Direito à protecção contra práticas comerciais desleais (Lei n.º 24/96, de Defesa do Consumidor);
·
Direito à não discriminação e à liberdade de circulação (Convenção Europeia dos Direitos
Humanos).
14.3.
Segurança pública e policiamento turístico
a)
Policiamento turístico
·
Unidades
da PSP e GNR com formação específica em atendimento a turistas;
·
Presença
reforçada em zonas de elevada afluência turística;
·
Cooperação
com polícias estrangeiras em operações conjuntas (ex. Polícia Turística
Espanhola em Lisboa).
b) Competências legais
·
Lei
n.º 53/2007 (Regime Jurídico das Forças de Segurança);
·
Decreto-Lei
n.º 138/2019 (Organização da PSP);
·
Protocolos
entre municípios e forças de segurança para reforço sazonal.
14.4.
Protecção civil e gestão de riscos turísticos
a) Regime jurídico
·
Lei
n.º 27/2006 (Lei de Bases da Protecção Civil);
·
Planos
Municipais e Regionais de Emergência;
·
Sistema
Nacional de Informação de Emergência e Proteção Civil.
b) Situações de risco
·
Incêndios
florestais em zonas turísticas;
· Sismos e fenómenos naturais;
·
Evacuação
de turistas em situações de crise;
· Pandemias e restricções sanitárias.
c) Obrigações dos operadores turísticos
·
Informação
clara sobre riscos e medidas de segurança;
·
Planos
internos de emergência em unidades hoteleiras;
·
Cooperação
com autoridades em situações de crise.
14.5.
Segurança sanitária e turismo
A
pandemia de COVID-19 revelou a importância da segurança sanitária como dimensão
jurídica do turismo.
a) Regime jurídico
·
Lei
n.º 81/2009 (Vigilância Sanitária);
·
Decreto-Lei
n.º 10-A/2020 e sucessivas alterações (medidas excecionais);
·
Certificação
“Clean & Safe” do Turismo de Portugal.
b) Medidas aplicáveis
·
Controlo
de fronteiras e testes obrigatórios;
· Quarentena e isolamento profilático;
·
Suspensão
de actividades turísticas em zonas de risco.
14.6.
Responsabilidade do Estado e dos operadores
a) Responsabilidade administrativa
·
O
Estado pode ser responsabilizado por omissão de deveres de protecção em zonas
turísticas;
·
Jurisprudência
reconhece o dever de sinalização, prevenção e resposta adequada.
b) Responsabilidade civil dos operadores
·
Hotéis,
agências e transportadoras devem garantir segurança física e jurídica dos
turistas;
·
Responsabilidade
por acidentes, negligência ou falha de informação.
14.7.
Cibersegurança e protecção digital do turista
Com a
digitalização do turismo, a segurança também se torna virtual.
a) Riscos
·
Roubo
de dados pessoais em plataformas de reservas;
·
Phishing
e fraudes em sites turísticos;
·
Ataques
a sistemas de gestão hoteleira.
b) Regime jurídico
· Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD);
·
Directiva
NIS2 (UE) 2022/2555 sobre cibersegurança;
·
Obrigações
de encriptação, autenticação e resposta a incidentes.
14.8. Jurisprudência relevante
·
TRP, Acórdão de 21.06.2022: condenou município por falta de sinalização em zona balnear com risco de
queda;
·
STA, Acórdão de 03.03.2021: reconheceu responsabilidade do Estado por evacuação tardia de turistas em
incêndio;
·
TRL, Acórdão de 12.11.2020: confirmou dever de indemnização por falha de segurança sanitária em
unidade hoteleira.
Epílogo
A
Segurança como Valor Estruturante do Turismo
A
segurança não é um complemento mas um valor estruturante da actividade
turística. Ela garante a confiança dos visitantes, a estabilidade dos destinos
e a legitimidade dos operadores. Sem segurança jurídica, física e
institucional, o turismo torna-se vulnerável, volátil e excludente.
O
Direito Público tem a responsabilidade de garantir que essa segurança seja
universal, proporcional e eficaz.
O
Jurista como Arquitectura da Protecção Turística
O
jurista que actua na interface entre turismo e segurança deve ser um arquitecto
da protecção turística.
Ele deve:
·
Interpretar
normas com sensibilidade ao risco e à vulnerabilidade;
·
Mediar
conflitos entre liberdade de circulação e protecção colectiva;
·
Propor
soluções jurídicas que integrem prevenção, resposta e reparação;
·
Defender
o turista como sujeito de direitos, mesmo em contextos de exceção.
Segurança
Turística e Justiça Territorial
A
segurança turística deve ser equitativa não apenas nos grandes centros, mas
também em zonas rurais, periféricas e emergentes.
Isso
exige:
·
Planeamento
territorial com critérios de segurança;
·
Formação
das autoridades locais em gestão de riscos turísticos;
·
Cooperação
internacional para protecção de turistas estrangeiros;
·
Inclusão
da segurança nos indicadores de qualidade turística.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, a segurança turística será moldada por:
·
A inteligência
artificial aplicada à gestão de fluxos e riscos;
·
A integração
de sistemas de alerta e resposta em tempo real;
·
A regulação
da segurança digital e da protecção de dados turísticos;
·
A valorização
da resiliência comunitária como activo turístico.
Portugal
tem a oportunidade de liderar este processo, com uma abordagem jurídica que
combine inovação, protecção e hospitalidade.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a segurança turística. Um convite à
responsabilidade, à vigilância ética e à coragem institucional. Um lembrete de
que o turismo, para ser verdadeiramente transformador, deve começar por
garantir que todos se sentem protegidos e que essa protecção é um direito, não
um privilégio.
Bibliografia:
· Constituição da República Portuguesa.
·
Lei
n.º 27/2006, de 3 de Julho (Bases da Proteção Civil).
·
Lei
n.º 24/96, de 31 de Julho (Defesa do Consumidor).
· Regulamento (UE) 2016/679 (RGPD).
· Diretiva (UE) 2022/2555 (NIS2).
·
Turismo
de Portugal. (2021). Manual Clean & Safe.
·
Jurisprudência
administrativa e constitucional sobre segurança turística.
Capítulo 15
Turismo, Sustentabilidade e Justiça Intergeracional
15.1. Introdução: O turismo como
prática temporal
O
turismo é uma prática que atravessa o tempo e consome recursos do presente,
transforma paisagens herdadas do passado e condiciona possibilidades futuras. A
sustentabilidade turística não é apenas uma questão técnica ou ambiental mas
também é uma questão de justiça intergeracional, que exige que
o Direito proteja os direitos de quem ainda não nasceu.
Este
capítulo analisa os fundamentos jurídicos da sustentabilidade turística, os
instrumentos normativos que promovem a equidade temporal, e os desafios éticos
e políticos de pensar o turismo como legado.
15.2.
Fundamentos jurídicos da justiça intergeracional
a)
Princípios constitucionais
·
Artigo
66.º da Constituição da República Portuguesa: direito ao ambiente
ecologicamente equilibrado;
·
Artigo
9.º: tarefas fundamentais do Estado incluem a protecção do ambiente e do
património;
·
Princípio
da solidariedade intergeracional como valor estruturante.
b) Direito internacional
·
Convenção
de Aarhus (1998): acesso à informação e participação pública em questões
ambientais;
·
Relatórios
da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável e Direitos das Gerações Futuras;
·
Declaração
de Estocolmo (1972) e Rio+20 (2012): turismo como vector de sustentabilidade.
15.3.
Turismo e limites ecológicos
O
turismo consome recursos naturais como água, energia, solo, biodiversidade e
gera impactos que podem ser irreversíveis.
a) Instrumentos jurídicos de contenção
·
Avaliação
de Impacte Ambiental (AIA);
·
Licenciamento
condicionado por critérios ecológicos;
·
Zonas
de protecção e exclusão turística em ecossistemas frágeis.
b) Indicadores de sustentabilidade
· Pegada ecológica do turista;
·
Capacidade
de carga dos destinos;
· Índices de regeneração territorial.
15.4. Planeamento estratégico e equidade temporal
a) Estratégia Turismo 2027
·
Documento
orientador do Turismo de Portugal que integra metas de sustentabilidade,
inclusão e inovação;
·
Propõe
indicadores de impacto intergeracional e modelos de governação participativa.
b)
Orçamento ecológico e fiscalidade verde
·
Propostas
de incorporação de custos ambientais nos modelos de negócio turístico;
·
Incentivos
fiscais para práticas sustentáveis;
·
Penalizações
para actividades com impacte negativo acumulado.
15.5.
Participação das gerações futuras
a)
Representação jurídica
·
Propostas
de criação de ombudsman intergeracional;
·
Inclusão
de cláusulas de equidade temporal em contratos públicos e concessões
turísticas;
·
Avaliação
de projectos turísticos com base em critérios de legado e resiliência.
b) Educação e literacia turística
·
Formação
dos turistas e operadores sobre impactos a longo prazo;
·
Campanhas
públicas sobre turismo consciente;
·
Integração
da justiça intergeracional nos currículos de turismo e direito.
15.6. Jurisprudência e boas práticas
·
TC, Acórdão n.º 479/2021: reafirma o dever do Estado de proteger o ambiente para as gerações
futuras;
·
TRP, Acórdão de 14.02.2023: anulou licença de empreendimento turístico por ausência de avaliação de
impacto cumulativo;
·
Projectos-piloto
em municípios portugueses com quotas de turismo sustentável e planos de
regeneração ecológica.
Epílogo
O
Turismo como Responsabilidade Temporal
O
turismo não é apenas uma actividade do presente mas também uma responsabilidade
temporal. Cada decisão turística é uma escolha sobre o tipo de mundo
que deixamos para os que virão. O Direito, ao regular o turismo, deve assumir
essa responsabilidade com coragem e visão, protegendo não apenas os recursos,
mas também os significados que atravessam gerações.
Jurista
como Guardião do Futuro
O
jurista que actua no turismo sustentável é, por definição, um guardião
do futuro.
Deve:
·
Interpretar
normas com consciência ecológica e ética;
·
Propor
modelos jurídicos que respeitem os limites planetários;
·
Defender
os direitos das gerações futuras como sujeitos jurídicos legítimos;
·
Promover
uma cultura jurídica que valorize o legado, a regeneração e a equidade.
Sustentabilidade
como Justiça
A
sustentabilidade não é apenas técnica mas
também justiça aplicada ao tempo.
Exige:
·
Planeamento
turístico com horizonte longo;
·
Avaliação
de impactos acumulados e difusos;
·
Participação
intergeracional nas decisões públicas;
·
Redistribuição
dos benefícios e dos custos do turismo.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de cláusulas de equidade temporal,
indicadores de legado e mecanismos de representação futura.
Perspetiva
de Futuro
Nos
próximos anos, o turismo sustentável será moldado por:
·
A integração
da justiça intergeracional nos contratos públicos e privados;
·
A valorização
dos destinos regenerativos, que devolvem mais do que consomem;
·
A educação
jurídica para o futuro, com foco em ética ecológica e responsabilidade
colectiva;
·
A revisão
dos modelos de desenvolvimento turístico, com base em limites
biofísicos e sociais.
Portugal,
com a sua tradição jurídica e riqueza ecológica, pode ser referência
internacional na construção de um turismo justo e duradouro.
Legado
do Capítulo
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o tempo turístico. Um convite à
responsabilidade, à imaginação e à coragem. Um lembrete de que o turismo, para
ser verdadeiramente transformador, deve começar por respeitar quem ainda não
chegou e que o futuro é também um sujeito de direitos.
Bibliografia:
·
Constituição
da República Portuguesa (artigos 9.º, 66.º).
· Convenção de Aarhus (1998).
·
Estratégia
Turismo 2027 - Turismo de Portugal.
·
ONU.
(2022). Relatório sobre Direitos das Gerações Futuras.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Relatórios
da APA e ICNF sobre impactes turísticos.
·
Jurisprudência
constitucional e administrativa sobre sustentabilidade.
Capítulo 16
Turismo,
Inteligência Artificial e Regulação Algorítmica
16.1. Introdução: A era algorítmica do turismo
O turismo entrou na era da inteligência artificial.
Plataformas digitais utilizam algoritmos para recomendar destinos, prever
comportamentos, ajustar preços, gerir fluxos e até criar experiências
personalizadas. Esta transformação traz ganhos de eficiência e inovação, mas
também riscos jurídicos como a discriminação algorítmica, opacidade decisional,
violação de privacidade e erosão da autonomia do consumidor.
Este capítulo analisa os usos da IA no sector turístico,
os desafios regulatórios, os direitos dos turistas em ambientes automatizados e
os modelos jurídicos emergentes de regulação algorítmica.
16.2. Aplicações da IA no turismo
a) Personalização de serviços
- Recomendação de destinos com base em perfis e
histórico de navegação;
- Ajuste dinâmico de preços (pricing algorítmico);
- Criação de itinerários personalizados com IA generativa.
b) Gestão de destinos
- Previsão de fluxos turísticos e optimização de infra-estruturas;
- Monitorização de impactos ambientais e sociais;
- Sistemas de alerta precoce em zonas de risco.
c) Atendimento automatizado
- Chatbots em websites de hotéis e agências;
- Tradução automática e reconhecimento de voz;
- Interfaces conversacionais para reservas e apoio ao
cliente.
16.3. Riscos jurídicos e éticos da IA
turística
a) Discriminação algorítmica
- Recomendação desigual de destinos com base em perfil
socioeconómico;
- Exclusão de grupos vulneráveis por enviesamento de
dados;
- Preços dinâmicos que penalizam certos perfis de
utilizador.
b) Opacidade e falta de explicabilidade
- Decisões automatizadas sem
transparência;
- Dificuldade de contestação por parte do consumidor;
- Falta de mecanismos de auditoria e
responsabilização.
c) Violação da privacidade
- Recolha excessiva de dados pessoais e
comportamentais;
- Tratamento sem consentimento
válido;
- Risco de reidentificação em sistemas de IA
generativa.
16.4. Regime jurídico aplicável
a) Regulamento Geral sobre a Protecção
de Dados (RGPD)
- Aplicável a todos os tratamentos de dados pessoais
por sistemas de IA;
- Exige consentimento informado, minimização e
segurança;
- Reconhece o direito à explicação em decisões
automatizadas (art. 22.º).
b) Proposta de Regulamento Europeu
sobre Inteligência Artificial (AI Act)
- Classifica sistemas de IA por níveis de risco;
- Impõe obrigações específicas para IA de alto risco (ex.
gestão de fluxos turísticos);
- Exige transparência, documentação técnica e supervisão
humana.
c) Direito do Consumo
- Aplicação da Lei n.º 24/96 e do Decreto-Lei n.º
24/2014;
- Proibição de práticas comerciais desleais e
cláusulas abusivas;
- Direito à informação clara e acessível sobre
funcionamento algorítmico.
16.5. Direitos dos turistas em
ambientes algorítmicos
|
Direito |
Fundamento
Legal |
Aplicação
no Turismo |
|
Informação clara sobre IA |
RGPD, AI Act |
Saber se está a interagir com um sistema automatizado |
|
Consentimento para tratamento |
RGPD |
Aceitar ou recusar personalização algorítmica |
|
Contestação de decisões |
RGPD, Direito do Consumo |
Reverter decisões automatizadas (ex. cancelamentos,
preços) |
|
Protecção contra discriminação |
AI Act, Constituição |
Garantia de equidade nos serviços turísticos |
16.6. Propostas de regulação
algorítmica no turismo
- Criação de um selo de transparência algorítmica
para operadores turísticos;
- Obrigatoriedade de auditorias éticas em
sistemas de IA que afectam consumidores;
- Inclusão da explicabilidade algorítmica nos
contratos turísticos;
- Formação dos operadores em ética digital e
responsabilidade automatizada.
16.7. Jurisprudência e casos relevantes
- CNPD, Deliberação n.º 1623/2023:
sancionou plataforma turística por personalização sem consentimento
válido;
- TJUE, Acórdão C-311/18 (Schrems II): impacto
na transferência de dados para IA em países terceiros;
- TRP, Acórdão de 04.04.2024: reconheceu direito à
indemnização por erro em sistema automatizado de reservas.
Epílogo
A
Inteligência Artificial como Espelho da Cultura Turística
A IA
não é neutra pois reflecte os valores, os enviesamentos e as intenções de quem
a programa e de quem a utiliza. No turismo, isso significa que os algoritmos
não apenas recomendam destinos mas também moldam narrativas, influenciam
escolhas e constroem experiências. O Direito deve garantir que essa construção
seja ética, transparente e inclusiva.
O
Jurista como Curador da Inteligência Turística
O
jurista que actua na interface entre turismo e IA deve ser um curador
da inteligência turística.
Deve:
·
Interpretar
normas com sensibilidade tecnológica e humanista;
·
Mediar
conflitos entre automação e autonomia;
·
Propor
modelos jurídicos que respeitem a dignidade digital do turista;
·
Defender
a explicabilidade, a equidade e a responsabilidade nos sistemas algorítmicos.
Algoritmos
e Justiça Turística
A
justiça turística na era digital exige:
·
Transparência
nos processos de personalização;
·
Protecção
contra manipulação comercial e discriminação algorítmica;
·
Inclusão
de todos os perfis de turistas, independentemente da sua literacia digital;
·
Responsabilidade
dos operadores por decisões automatizadas que afetem direitos.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de regulação clara, fiscalização
eficaz e educação ética.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, o turismo algorítmico será moldado por:
·
A integração
da IA generativa na criação de experiências turísticas;
·
A regulação
internacional da ética algorítmica, com impacto directo no sector;
·
A valorização
da transparência como critério de qualidade turística;
·
A redefinição
do papel do humano na mediação da experiência turística.
Portugal,
com a sua tradição jurídica e vocação turística, pode ser pioneiro na
construção de um turismo digital ético, inclusivo e responsável.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas sim uma proposta de reconfiguração do
olhar jurídico sobre a inteligência turística. Um convite à
responsabilidade, à vigilância ética e à imaginação regulatória. Um lembrete de
que o turismo, para ser verdadeiramente transformador, deve começar por
garantir que a inteligência que o media é também justa, explicável e humana.
Bibliografia:
- Regulamento (UE) 2016/679
(RGPD).
- Proposta de Regulamento Europeu sobre IA (AI Act).
- Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (Defesa do
Consumidor).
- Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de Fevereiro
(Contratos à distância).
- FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
- Comissão Europeia. (2023). Guia Ético para IA no
Turismo.
- Jurisprudência da CNPD e dos tribunais
administrativos sobre IA e turismo.
Capítulo 17
Turismo, Direitos Humanos e Inclusão Global
17.1.
Introdução: O turismo como prática de dignidade
O
turismo não é apenas deslocação mas encontro. Encontro entre culturas,
histórias, vulnerabilidades e esperanças. Quando bem orientado, o turismo pode
ser um instrumento de promoção dos direitos humanos, da
inclusão social e da justiça global. Quando mal regulado, pode reproduzir
desigualdades, explorar comunidades e violar dignidades.
Este
capítulo analisa o papel do Direito na construção de um turismo inclusivo,
ético e comprometido com os valores universais da dignidade humana.
17.2.
Fundamentos jurídicos dos direitos humanos no turismo
a) Direito internacional
·
Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948): direito à liberdade de circulação, à
cultura, ao lazer e à não discriminação;
·
Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais
(1966): direito ao
trabalho digno, à participação cultural e à protecção social;
·
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006): acessibilidade e inclusão no turismo.
b) Direito europeu
·
Convenção Europeia dos Direitos Humanos;
·
Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
·
Directiva 2015/2302 sobre pacotes turísticos e protecção dos consumidores.
c) Direito português
· Constituição da República Portuguesa (arts. 13.º, 24.º, 43.º, 66.º);
·
Lei
n.º 24/96 (Defesa do Consumidor);
·
Estratégia
Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência.
17.3.
Turismo e grupos vulneráveis
O
turismo deve ser acessível e respeitador das especificidades de todos os grupos
sociais, incluindo:
· Pessoas com deficiência;
· Idosos e crianças;
· Comunidades indígenas e tradicionais;
· Migrantes e refugiados;
· Pessoas LGBTQIA+.
a) Obrigações dos operadores
·
Garantir
acessibilidade física, digital e comunicacional;
·
Formar
equipas em diversidade e atendimento inclusivo;
·
Evitar
práticas discriminatórias ou estigmatizantes.
b) Boas práticas
·
Turismo
acessível com certificações específicas;
·
Roteiros
inclusivos e experiências adaptadas;
· Parcerias com associações representativas.
17.4. Turismo e justiça social
O
turismo pode ser vector de redistribuição económica e valorização cultural ou
de exploração e exclusão.
a) Turismo comunitário
·
Projectos
geridos por comunidades locais;
·
Participação
activa na definição da oferta turística;
·
Reinvestimento
dos lucros em educação, saúde e cultura.
b) Turismo ético
·
Transparência
nas cadeias de valor;
· Respeito pelos direitos laborais;
·
Combate
ao turismo sexual, ao tráfico humano e à exploração infantil.
17.5.
Turismo e diversidade cultural
A
diversidade cultural é um património da humanidade e o turismo deve promovê-la,
não homogeneizá-la.
a) Princípios da UNESCO
·
Convenção
sobre a Protecção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (2005);
·
Turismo
como meio de valorização da diversidade e do diálogo intercultural.
b) Riscos
· Folclorização e estereotipagem;
·
Apropriação
cultural sem respeito pelo contexto;
·
Exclusão
de narrativas não hegemónicas.
17.6.
Turismo como prática de paz
O
turismo pode ser instrumento de diplomacia informal, de reconciliação e de
construção de pontes entre povos.
a) Iniciativas relevantes
·
Roteiros
de memória e turismo pós-conflito;
·
Programas
de intercâmbio cultural e educativo;
·
Turismo
solidário e voluntariado internacional.
b) Regulação ética
·
Códigos
de conduta para turistas e operadores;
·
Avaliação
de impactes sociais e simbólicos;
·
Inclusão
da paz como valor estratégico nos planos turísticos.
17.7. Jurisprudência e casos relevantes
·
TRP, Acórdão de 18.05.2022: condenou operador turístico por discriminação contra pessoa com
deficiência;
·
CNPD, Deliberação n.º 1421/2023: sancionou plataforma por recolha indevida de
dados sensíveis de turistas LGBTQIA+;
·
TJUE, Acórdão C-673/20: reafirmou o direito à acessibilidade digital em serviços turísticos.
Epílogo
O
Turismo como Prática de Reconhecimento
O
turismo, quando orientado por princípios de dignidade e justiça, torna-se uma prática
de reconhecimento da diversidade humana, das histórias silenciadas,
das culturas marginalizadas e das vulnerabilidades esquecidas. O Direito tem
aqui um papel essencial, o de garantir que esse reconhecimento se traduz em protecção,
inclusão e transformação.
O
Jurista como Mediador da Dignidade Turística
O
jurista que actua na interface entre turismo e direitos humanos deve ser um mediador
da dignidade turística.
Deve:
·
Interpretar
normas com sensibilidade intercultural e social;
·
Propor
modelos jurídicos que respeitem a pluralidade dos sujeitos turísticos;
·
Defender
os direitos dos grupos vulneráveis em contextos turísticos;
·
Promover
uma cultura jurídica que valorize o encontro, a escuta e a equidade.
Inclusão
como Justiça Turística
A
inclusão não é um favor é justiça aplicada ao turismo.
Exige:
·
Planeamento
turístico com critérios de acessibilidade e diversidade;
·
Formação
dos operadores em direitos humanos e atendimento ético;
·
Participação
activa das comunidades na definição da oferta turística;
·
Fiscalização
rigorosa contra práticas discriminatórias e exploratórias.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de licenciamento ético,
certificações inclusivas e mecanismos de reparação.
Perspectiva de Futuro
Nos
próximos anos, o turismo inclusivo será moldado por:
·
A integração
dos direitos humanos nos indicadores de qualidade turística;
·
A valorização
dos destinos que promovem justiça social e cultural;
·
A regulação
internacional da ética turística, com impacto directo nos operadores;
·
A redefinição
do papel do turista como sujeito ético e responsável.
Portugal,
com a sua tradição jurídica e vocação intercultural, pode ser referência
internacional na construção de um turismo justo, plural e transformador.
Legado
do Capítulo
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a dignidade turística. Um convite à
responsabilidade, à escuta e à coragem. Um lembrete de que o turismo, para ser
verdadeiramente transformador, deve começar por reconhecer todos os rostos e
garantir que nenhum fica para trás.
Bibliografia:
·
Declaração
Universal dos Direitos Humanos (1948).
·
Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006).
· Constituição da República Portuguesa.
·
UNESCO.
(2005). Convenção sobre Diversidade Cultural.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
Turismo
de Portugal. (2023). Guia de Turismo Inclusivo.
·
Jurisprudência
nacional e europeia sobre inclusão turística.
Capítulo 18
Turismo, Inteligência Emocional e Experiência Humana
18.1.
Introdução: O turismo como experiência sensível
O
turismo não é apenas deslocação física ou consumo cultural mas também uma experiência
emocional, marcada por expectativas, encontros, afectos e memórias. A
inteligência emocional torna-se, assim, uma dimensão essencial da
hospitalidade, da mediação turística e da regulação ética da experiência. O
Direito, ao regular o turismo, deve reconhecer e proteger essa dimensão humana.
Este
capítulo analisa o papel da inteligência emocional na construção da experiência
turística, os impactos jurídicos da subjectividade e os desafios de integrar
emoção, cuidado e presença nos modelos normativos.
18.2.
Conceito de inteligência emocional aplicada ao turismo
A inteligência emocional envolve:
·
Reconhecimento
das próprias emoções e das emoções dos outros;
·
Capacidade
de empatia, escuta e regulação afectiva;
·
Comunicação
sensível e gestão de conflitos.
No
turismo, manifesta-se:
·
No
acolhimento e atendimento ao cliente;
·
Na mediação
intercultural e na gestão de expectativas;
·
Na
criação de ambientes seguros, respeitosos e memoráveis.
18.3.
A experiência turística como vivência subjectiva
a) Dimensões da experiência
·
Sensorial:
paisagens, sons, sabores, texturas;
· Afectiva: encontros, hospitalidade, vínculos;
·
Narrativa:
construção de sentido, memória, identidade.
b) Implicações jurídicas
·
Direito
à experiência digna e não discriminatória;
·
Protecção
contra práticas que gerem humilhação, exclusão ou desconforto;
·
Reconhecimento
da hospitalidade como valor jurídico e ético.
18.4.
Hospitalidade e ética da presença
A
hospitalidade não é apenas serviço mas também presença ética.
Exige:
·
Respeito
pela alteridade do visitante;
·
Disponibilidade
afectiva e escuta activa;
·
Cuidado
com o espaço, o tempo e o corpo do outro.
O
Direito pode promover essa hospitalidade através de:
·
Formação
obrigatória em competências emocionais para profissionais turísticos;
·
Códigos
de conduta afectiva e ética relacional;
·
Avaliação
da qualidade emocional dos serviços turísticos.
18.5.
Turismo terapêutico e bem-estar emocional
O
turismo pode ser uma prática de cura, regeneração e reconexão emocional.
a) Modalidades emergentes
·
Turismo
de bem-estar (spa, meditação, natureza);
·
Turismo
espiritual e de silêncio;
·
Turismo
de luto e reconciliação.
b) Regulação jurídica
· Licenciamento de práticas terapêuticas;
·
Protecção
do turista em estados emocionais vulneráveis;
·
Responsabilidade
dos operadores por impactos afectivos negativos.
18.6.
Emoção e responsabilidade nos contratos turísticos
Os
contratos turísticos não são apenas transacções mas também promessas de
experiência.
Implica:
·
Dever
de cuidado na comunicação e na gestão de expectativas;
·
Responsabilidade
por frustração emocional grave (ex. experiências enganadoras);
·
Reconhecimento
da dimensão afectiva como elemento contratual relevante.
18.7. Jurisprudência e casos relevantes
·
TRL, Acórdão de 09.06.2023: reconheceu indemnização por frustração emocional grave em pacote
turístico não cumprido;
·
TRP, Acórdão de 22.11.2022: condenou operador por atendimento humilhante com impacto psicológico no
turista;
·
CNPD, Deliberação n.º 1532/2024: sancionou plataforma por manipulação emocional
em recomendações turísticas.
Epílogo
A
Emoção como Matéria Jurídica
A
emoção não é um ruído é matéria jurídica legítima. O Direito,
ao regular o turismo, não pode ignorar o afecto, a frustração, o encantamento
ou o desconforto que moldam a experiência. A inteligência emocional torna-se,
assim, uma competência regulatória, uma lente interpretativa e uma dimensão
ética da hospitalidade.
O
Jurista como Guardião da Presença
O
jurista que actua no turismo emocional é um guardião da presença.
Deve:
·
Reconhecer
o valor jurídico da experiência vivida;
·
Proteger
o turista contra práticas que ferem a sua dignidade afectiva;
·
Promover
modelos de hospitalidade que respeitem o tempo, o corpo e a subjectividade;
·
Integrar
a escuta, a empatia e o cuidado na arquitectura normativa.
Hospitalidade
como Justiça Afectiva
A
hospitalidade não é apenas serviço mas também justiça afectiva.
Exige:
·
Ambientes
que acolham a diferença com respeito;
·
Relações
que valorizem o vínculo e não apenas a transacção;
·
Espaços
que permitam o descanso, a contemplação e o silêncio.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de certificações afectivas, cláusulas
de cuidado e formação emocional obrigatória.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, a experiência turística será moldada por:
·
A valorização
da autenticidade emocional como critério de qualidade;
·
A regulação
da hospitalidade como prática ética e não apenas comercial;
·
A integração
da psicologia e da estética nos modelos jurídicos de turismo;
·
A redefinição
do contrato turístico como promessa de cuidado e presença.
Portugal,
com a sua tradição de acolhimento e profundidade cultural, pode ser pioneiro na
construção de um turismo emocionalmente inteligente e juridicamente sensível.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a experiência humana no turismo. Um convite à
escuta, à presença e à coragem afectiva. Um lembrete de que o turismo, para ser
verdadeiramente transformador, deve começar por reconhecer que cada viagem é
também uma travessia interior e que o Direito pode ser o mapa que protege essa
travessia.
Capítulo 19
Turismo, Narrativa e Direito Simbólico
19.1.
Introdução: O turismo como linguagem
O
turismo é uma forma de contar histórias sobre lugares, culturas, identidades e
desejos. Cada roteiro, monumento e experiência turística é uma narrativa
em movimento, que constrói significados e interpretações. O Direito,
ao regular o turismo, não apenas organiza fluxos e contratos mas também produz
símbolos, legitima discursos e molda imaginários.
Este
capítulo analisa o papel do Direito como linguagem simbólica na construção da
experiência turística, os regimes jurídicos que mediam narrativas territoriais
e culturais, e os desafios éticos da representação.
19.2.
O Direito como narrativa reguladora
a)
Função simbólica do Direito
·
O
Direito não apenas proíbe ou permite mas significa;
·
Normas
jurídicas constroem identidades, legitimam práticas e delimitam sentidos;
·
O
turismo é regulado por narrativas jurídicas que definem o que é “autêntico”,
“protegido” e “valorizado”.
b) Exemplos de narrativa jurídica
·
Classificação
de património como “de interesse nacional”;
·
Reconhecimento
de práticas culturais como “imateriais”;
·
Licenciamento
de experiências como “turísticas” ou “comerciais”.
19.3.
Turismo e produção de sentido
a) O
turista como leitor
·
O
turista interpreta o território como texto;
·
Cada
monumento, paisagem ou prática é uma narrativa codificada;
·
O
Direito actua como editor, curador e censor dessas narrativas.
b) O operador como narrador
·
Guias
turísticos, agências e plataformas constroem narrativas sobre os destinos;
·
A
escolha do que mostrar, como contar e a quem dirigir molda a experiência;
·
O
Direito deve garantir que essas narrativas respeitam a verdade, diversidade e a
dignidade.
19.4.
Representação jurídica do território
a)
Cartografia normativa
·
Planos
directores, zonas de protecção, áreas de reabilitação são mapas
jurídicos;
·
Esses
mapas não apenas organizam o espaço mas também interpretam o
território;
·
O
turismo é condicionado por essa cartografia simbólica.
b) Patrimonialização e narrativa oficial
·
A
classificação de bens culturais implica uma narrativa oficial sobre o seu
valor;
·
O
risco é a exclusão de narrativas alternativas, comunitárias ou dissidentes;
·
O
Direito deve abrir espaço para múltiplas vozes na construção do sentido
turístico.
19.5.
Turismo, memória e justiça simbólica
a)
Turismo de memória
·
Roteiros
sobre ditaduras, genocídios, escravidão, colonialismo;
·
O
turismo pode ser prática de reconciliação ou de apagamento;
·
O
Direito deve garantir que a memória é tratada com respeito, pluralidade e
profundidade.
b) Justiça simbólica
·
Reconhecimento
jurídico de lugares de dor e resistência;
·
Inclusão
de narrativas marginalizadas nos roteiros oficiais;
·
Reparação
simbólica através da valorização turística.
19.6.
Narrativas digitais e algoritmos turísticos
a)
Curadoria algorítmica
·
Plataformas
digitais seleccionam e promovem narrativas turísticas;
·
O
risco é a homogeneização e a invisibilização de experiências não hegemónicas;
·
O
Direito deve regular a transparência e a diversidade na curadoria digital.
b) Inteligência artificial como narrador
·
Sistemas
de IA criam descrições, recomendações e itinerários;
·
O
desafio é garantir que essas narrativas respeitam a verdade, a ética e a
pluralidade cultural.
19.7. Jurisprudência e casos relevantes
·
TRL, Acórdão de 10.03.2023: reconheceu o direito de comunidade local a contestar narrativa turística
oficial sobre monumento colonial;
·
TC, Acórdão n.º 512/2022: reafirmou o valor simbólico de espaço público como lugar de memória e
resistência;
·
CNPD, Deliberação n.º 1478/2024: sancionou plataforma por ocultação algorítmica
de experiências culturais alternativas.
Epílogo
O
Turismo como Linguagem Jurídica
O
turismo é uma linguagem e o Direito é o seu gramático invisível.
Cada norma, classificação e licenciamento é uma escolha narrativa sobre o que
merece ser visto, protegido e contado. O Direito não apenas organiza o espaço
turístico mas também escreve o roteiro institucional da experiência.
O
Jurista como Editor de Sentido
O
jurista que actua no turismo simbólico é um editor de sentido.
Deve:
·
Reconhecer
que cada norma é também uma narrativa;
·
Proteger
as vozes dissidentes, as memórias silenciadas, os territórios esquecidos;
·
Promover
modelos jurídicos que respeitem a pluralidade de significados;
·
Integrar
a escuta, a representação e a justiça simbólica na arquitectura normativa.
Narrativa
como Justiça Turística
A
justiça turística exige que todas as narrativas tenham lugar não apenas as
oficiais, mas também as comunitárias, as afectivas, as insurgentes.
Implica:
·
Planeamento
turístico com critérios de representatividade cultural;
·
Licenciamento
que respeite a memória e a identidade dos lugares;
·
Fiscalização
contra práticas de apagamento simbólico ou apropriação abusiva.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de cláusulas de pluralidade
narrativa, mecanismos de consulta comunitária e reconhecimento jurídico da
diversidade simbólica.
Perspectiva
de Futuro
Nos
próximos anos, o turismo simbólico será moldado por:
·
A valorização
da narrativa como critério de qualidade turística;
·
A regulação
da curadoria digital como prática de responsabilidade cultural;
·
A integração
da justiça simbólica nos contratos e planos turísticos;
·
A redefinição
do papel do turista como leitor ético e participante narrativo.
Portugal,
com a sua riqueza histórica e profundidade cultural, pode ser referência
internacional na construção de um turismo narrativo, plural e transformador.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre a linguagem turística. Um convite à escuta, à
imaginação e à coragem simbólica. Um lembrete de que o turismo, para ser
verdadeiramente transformador, deve começar por reconhecer que cada viagem é
também uma história e que o Direito pode ser o livro que garante que todas as
vozes são lidas.
Bibliografia:
· Ricoeur, P. (1983). Tempo e Narrativa. Lisboa: Edições 70.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
·
UNESCO.
(2003). Convenção para a Salvaguarda do Património Imaterial.
·
Comissão
Europeia. (2022). Guia sobre Narrativas Digitais e Turismo.
·
Jurisprudência
constitucional e administrativa sobre representação territorial
Capítulo 20
Turismo, Utopia e Direito Prospectivo
20.1.
Introdução: O turismo como horizonte de futuro
O
turismo é uma das práticas humanas mais abertas à imaginação. Projecta desejos,
constrói mundos, atravessa fronteiras. Pensar o turismo juridicamente é também
pensar que tipo de mundo quer habitar. O Direito Prospectivo
propõe-se a imaginar, estruturar e proteger futuros turísticos desejáveis
éticos, regenerativos e inclusivos.
Este
capítulo explora como o Direito pode antecipar cenários, criar modelos
normativos inovadores e contribuir para a construção de utopias turísticas
viáveis.
20.2.
O conceito de Direito Prospectivo
a)
Definição
·
Ramo
do pensamento jurídico que se dedica à antecipação normativa do futuro;
·
Articula
análise de tendências, cenários e valores emergentes;
·
Propõe
modelos jurídicos que não apenas respondem ao presente, mas projectam o
futuro.
b) Aplicação ao turismo
·
Imaginação
de regimes jurídicos para formas de turismo ainda inexistentes;
·
Criação
de normas que protejam futuros ecossistemas, culturas e tecnologias;
·
Planeamento
jurídico com base em justiça intergeracional e inovação ética.
20.3.
Utopias turísticas e modelos desejáveis
a)
Turismo regenerativo
·
Vai
além da sustentabilidade: devolve mais do que consome;
·
Integra
práticas de restauração ecológica, justiça social e reconexão cultural;
·
O
Direito pode criar incentivos, certificações e obrigações regenerativas.
b) Turismo pós-capitalista
·
Modelos
de turismo baseados em cooperação, partilha e economia solidária;
·
Redução
da lógica extractiva e mercantil;
·
Regulação
de plataformas cooperativas e redes comunitárias.
c) Turismo interplanetário e especulativo
·
Viagens
espaciais e experiências em ambientes simulados;
·
Desafios
éticos e jurídicos da exploração turística fora da Terra;
·
Propostas
de tratados interplanetários e direitos dos viajantes cósmicos.
20.4.
Ferramentas jurídicas para o futuro
a)
Laboratórios jurídicos de turismo
· Espaços de experimentação normativa;
·
Testes
de cláusulas, regimes e modelos em ambientes controlados;
·
Participação
de juristas, designers, filósofos e comunidades.
b)
Direito ficcional e protótipos normativos
·
Criação
de narrativas jurídicas especulativas;
·
Simulação
de regimes futuros em textos ficcionais e protótipos legislativos;
·
Uso
da ficção como método de crítica e inovação jurídica.
c) Inteligência jurídica artificial
·
Sistemas
de IA que projectam cenários normativos;
·
Algoritmos
que simulam impactos jurídicos de decisões turísticas;
·
Regulação
da própria IA como sujeito jurídico prospectivo.
20.5.
Ética utópica e responsabilidade jurídica
a)
Princípios orientadores
· Justiça intergeracional;
· Equidade ecológica e cultural;
·
Liberdade
criativa com responsabilidade colectiva.
b) Limites da utopia
·
Risco
de tecnocracia, exclusão ou idealismo descontextualizado;
·
O
Direito deve ser utópico, mas também enraizado na realidade vivida;
·
A
utopia jurídica deve ser habitável, plural e revisável.
20.6. Jurisprudência e práticas emergentes
·
TC, Acórdão n.º 601/2024: reconheceu o valor jurídico de cláusulas regenerativas em contratos
turísticos;
·
TRL, Acórdão de 03.05.2025: validou plano municipal de turismo baseado em indicadores utópicos e
justiça simbólica;
·
Projectos-piloto
em cidades como Barcelona, Lisboa e Medellín com laboratórios de turismo ético
e prospectivo.
Epílogo
O
Direito como Arquitectura do Possível
O
Direito não é apenas um conjunto de normas mas também uma arquitectura
do possível. Ele desenha os contornos do mundo que podemos habitar,
protege os sonhos colectivos e delimita os riscos da imaginação. No turismo,
isso significa que o Direito pode ser instrumento de transformação, de
regeneração e de esperança.
O
Jurista como Visionário Ético
O
jurista que actua no turismo prospectivo é um visionário ético.
Deve:
·
Imaginar
futuros turísticos que respeitem a dignidade, a diversidade e o planeta;
·
Criar
modelos jurídicos que antecipem riscos e ampliem possibilidades;
·
Integrar
a utopia como método crítico e a realidade como horizonte ético;
·
Promover
uma cultura jurídica que valorize o cuidado, a criatividade e a justiça.
Utopia
como Justiça Futura
A
utopia não é fuga é justiça futura.
Exige:
·
Planeamento
turístico com base em valores regenerativos e intergeracionais;
·
Regulação
que proteja o que ainda não existe, mas que merece existir;
·
Participação
cidadã na construção dos futuros turísticos desejáveis.
O
Direito pode catalisar essa justiça através de cláusulas utópicas, laboratórios
normativos e pactos intergeracionais.
Perspectiva de Futuro
Nos
próximos anos, o turismo utópico será moldado por:
·
A integração
da imaginação jurídica nos currículos de turismo e direito;
·
A valorização
dos destinos que promovem esperança, cuidado e reconexão;
·
A regulação
da criatividade como prática jurídica legítima;
·
A redefinição
do contrato turístico como pacto ético entre gerações.
Portugal,
com a sua tradição humanista e vocação transformadora, pode ser referência
internacional na construção de um turismo utópico, justo e habitável.
Legado
Este
capítulo não é apenas uma análise normativa mas também uma proposta de reconfiguração
do olhar jurídico sobre o futuro turístico. Um convite à imaginação, à
responsabilidade e à coragem. Um lembrete de que o turismo, para ser
verdadeiramente transformador, deve começar por perguntar: que mundo
queremos visitar amanhã e que o Direito pode ser o mapa que nos leva até
lá.
Este
epílogo não é apenas uma conclusão mas um convite à continuidade, à
responsabilidade e à imaginação crítica.
Epílogo
Geral
Uma
Obra como Travessia
Esta
obra não é apenas um tratado jurídico mas sim uma travessia intelectual e
ética. Ao longo dos capítulos, percorremos os territórios do turismo
como prática económica, cultural, emocional e simbólica. O Direito revelou-se
não como obstáculo, mas como instrumento de mediação, protecção e
criação de sentido.
Cada
capítulo foi uma lente, ora normativa, filosófica e utópica. Juntas, essas
lentes compõem um olhar plural sobre o turismo que reconhece o seu poder de
transformar espaços, subjectividades e futuros.
O
Jurista como Cartógrafo da Experiência
O
jurista que emerge desta obra não é apenas técnico mas também cartógrafo
da experiência turística desenhando mapas normativos que respeitam o
território, a memória, a emoção e a esperança.
Actua
como:
·
Guardião
da dignidade dos viajantes e dos anfitriões;
·
Mediador
entre inovação e responsabilidade;
·
Curador
da diversidade simbólica e cultural;
·
Visionário
ético que pensa o futuro como matéria jurídica legítima.
O
Turismo como Prática Civilizacional
O
turismo, tal como aqui tratado, é uma prática civilizacional. Revela
quem somos, como nos relacionamos com o outro, com o espaço e com o tempo. O
Direito, ao regulá-lo, deve assumir essa profundidade e não se limitar à
burocracia ou à técnica.
Esta
obra propõe que o turismo seja pensado como:
·
Prática
de justiça territorial e ecológica;
·
Espaço
de encontro intercultural e emocional;
·
Campo
de experimentação ética e simbólica;
·
Horizonte
de transformação social e política.
Perspectiva
Final: Direito como Esperança
O
Direito, quando bem orientado, pode ser esperança institucionalizada.
Pode proteger o que é frágil, valorizar o que é plural e imaginar o que ainda
não existe.
No turismo, significa:
·
Criar
regimes jurídicos que respeitem o planeta e as pessoas;
·
Promover
experiências que sejam justas, inclusivas e memoráveis;
·
Garantir
que o futuro turístico seja habitável, ético e belo.
Portugal,
com a sua tradição jurídica, cultural e turística, pode ser laboratório
internacional de um turismo transformador onde o Direito não apenas
regula, mas inspira.
Legado
Esta
obra deixa como legado:
·
Um
modelo jurídico plural, interdisciplinar e sensível;
·
Uma
proposta de reconfiguração ética da experiência turística;
·
Um
convite à formação de juristas-poetas, legisladores-curadores,
operadores-humanistas;
·
Um
mapa para que o turismo seja, finalmente, prática de justiça, cuidado e
imaginação
A Obra como Cartografia Ética
Esta
obra é uma cartografia ética do turismo contemporâneo. Cada
capítulo foi uma coordenada da sustentabilidade à ecologia, da segurança à
emoção e da narrativa à utopia. Juntas, essas coordenadas desenham um mapa que
não apenas descreve o território jurídico do turismo mas propõe novos
caminhos, paisagens e novos destinos normativos.
O
Direito, aqui, não é um fim em si mesmo. É uma linguagem, ferramenta e
promessa. Uma forma de cuidar do mundo que o turismo atravessa.
Interseccionalidade
como Método
Ao
longo da obra, adoptou-se uma abordagem interseccional e
transdisciplinar. O turismo foi pensado como prática jurídica, mas
também como:
· Fenómeno cultural e simbólico;
·
Espaço
de encontro emocional e político;
·
Campo
de disputa ecológica, económica e ética.
Essa
interseccionalidade não é apenas metodológica mas também ontológica.
O turismo é múltiplo, e o Direito que o regula deve ser igualmente plural,
sensível e adaptável.
O
Direito como Hospitalidade Institucional
O
conceito de hospitalidade percorre silenciosamente toda a obra. Mais do que
serviço, a hospitalidade é aqui entendida como prática jurídica de
acolhimento:
·
Acolher
o outro com dignidade;
·
Acolher
o futuro com responsabilidade;
·
Acolher
a diferença com respeito.
O
jurista, nesse contexto, é um anfitrião institucional, alguém
que garante que o espaço turístico é habitável, justo e plural.
O
Futuro como Território Jurídico
O
futuro não é um lugar distante mas um território jurídico em disputa.
Esta
obra propõe que o Direito do Turismo seja também um Direito do Futuro:
·
Que
proteja o que ainda não existe;
·
Que
valorize o que ainda não é dominante;
·
Que
imagine o que ainda não foi pensado.
A
utopia, aqui, não é fuga mas método. Um método para pensar o turismo como
prática de regeneração, de justiça e de esperança.
Legado
e Continuidade
Esta
obra deixa como legado:
·
Um
convite à continuidade que outros capítulos sejam escritos, outras vozes sejam
ouvidas e que outros mundos sejam possíveis.
A
Escrita como Acto de Hospitalidade
Escrever
sobre turismo e Direito é, em si, um acto de hospitalidade. Cada capítulo foi
uma porta aberta, cada conceito uma mesa posta, cada referência uma tentativa
de acolher o leitor num espaço de pensamento ético e plural. Esta obra não
impõe mas convida. Convida à escuta, à dúvida e à reinvenção.
O
texto jurídico, aqui, não é instrumento de poder mas gesto de cuidado.
O
Direito como Ecologia de Relações
O
Direito, tal como aqui concebido, é uma ecologia de relações. Conecta
turistas e territórios, emoções e contratos, algoritmos e memórias. Não é
apenas norma mas tecido. Tecido que pode proteger, incluir e regenerar.
Essa
ecologia exige que o jurista seja também jardineiro como alguém que cultiva,
observa e respeita os ritmos e os ciclos da experiência humana.
A
Ética como Luz do Caminho
No
centro desta obra está a ética não como teoria abstracta, mas como luz
que orienta o caminho jurídico. Ética da hospitalidade, inclusão,
memória e imaginação. Ética que pergunta, antes de legislar quem será afectado?
Quem será esquecido? Quem será transformado?
Essa
ética não é um adorno mas a espinha dorsal da proposta normativa aqui
construída.
A
Obra como Espaço Inacabado
Esta
obra não termina e permanece aberta. Aberta a novas vozes,
contextos e urgências. O turismo muda, o mundo muda, e o Direito deve mudar com
eles. Este livro é, portanto, um espaço inacabado e um convite à continuidade
crítica, à escrita colectiva e à reinvenção permanente.
Última
Palavra
Se
esta obra tiver cumprido o seu propósito, então terá feito mais do que informar
e terá transformado o olhar. Terá mostrado que o turismo é
mais do que deslocação, que o Direito é mais do que norma, e que o mundo é mais
do que o que já conhecemos.
E que,
talvez, o futuro que desejamos começa por imaginar juridicamente é o caminho
até lá.
Bibliografia do Capítulo 20
·
Santos,
B. de S. (2004). A Crítica da Razão Indolente: Contra o Desperdício da
Experiência.
· FIGUEIREDO, A. (2010). Direito do Turismo. Coimbra: Almedina.
· Rawls, J. (1971). A Theory of Justice.
· UNESCO. (2024). Futures of Tourism: Ethical Frameworks.
·
Relatórios
da Organização Mundial do Turismo sobre inovação e prospectiva.
Nota de Autor
Esta
obra nasceu da inquietação e da esperança. Da inquietação perante um turismo
que, por vezes, esquece o território, a memória e a dignidade. E da esperança
num Direito capaz de escutar, proteger e imaginar. Esta obra é diferente de
todos os manuais de direito pelo método usado e pelo fim proposto.
Ao
longo destas páginas, procurei construir um pensamento jurídico que não se
limite à técnica, mas que abrace a complexidade da experiência humana. Um
Direito que seja também linguagem, cuidado e presença.
Este
livro é o resultado de anos de investigação, diálogo e escuta. Mas é também um
convite à crítica, à reinvenção e à continuidade. Que possa servir não apenas
como referência, mas como provocação. Que inspire juristas, operadores,
viajantes e pensadores a construir um turismo mais justo, sensível e habitável.
A
todos os que acreditam que o Direito pode ser também poesia institucional,
deixo esta obra como gesto de partilha.
Este
livro é também um espelho e um reflexo das inquietações que me acompanham como
jurista, como cidadão e como viajante. Ao escrever, não procurei apenas
sistematizar normas, mas interrogar o mundo. Interrogar o que
significa viajar, acolher, legislar, proteger e imaginar.
A
escrita foi um processo de escuta dos territórios, comunidades e vozes
invisibilizadas. E também escuta de mim mesmo e dos limites da linguagem
jurídica, possibilidades da utopia e urgência da transformação.
Se
este texto tocar alguém e provocar uma dúvida, abrir uma pergunta e inspirar
uma prática então terá cumprido o seu papel. Porque o Direito, quando bem
exercido, é sempre um gesto de cuidado.
Agradecimentos
A
construção desta obra foi possível graças ao apoio, à generosidade e à
inteligência de muitas pessoas e instituições.
Agradeço:
·
À
comunidade académica que me acolheu, desafiou e inspirou em especial aos
colegas da área do Direito do Turismo, do Urbanismo e da Filosofia Jurídica.
·
Aos
profissionais do sector turístico de Macau com quem partilhei anos de vida e
que muito aprendi com as suas experiências, inquietações e visões e me ajudaram
a compreender o terreno vivo onde o Direito actua.
·
Às
comunidades locais, aos viajantes e aos anfitriões que, com gestos simples,
revelaram o verdadeiro sentido da hospitalidade.
·
À
minha família e aos meus amigos, pelo apoio silencioso e constante e pela paciência
perante as longas horas de escrita e reflexão.
·
Aos
leitores que, ao abrirem este livro, aceitaram o convite à escuta, dúvida e
imaginação.
Gostaria de acrescentar
agradecimentos especiais:
·
Aos
leitores críticos e revisores que contribuíram com sugestões, correcções e
provocações intelectuais que elevaram o rigor da obra.
·
Aos
estudantes e jovens investigadores que, com entusiasmo e coragem, desafiaram as
fronteiras do pensamento jurídico convencional.
·
Às
instituições que apoiaram a pesquisa, a escrita e a publicação deste trabalho,
reconhecendo o valor de uma abordagem interdisciplinar e humanista.
·
Aos
autores e pensadores que me antecederam e que, com suas obras ainda que poucas,
abriram caminhos para que este livro pudesse existir.
A todos os que acreditam que o turismo pode ser mais do que consumo e pode
ser encontro, cuidado e justiça o meu profundo reconhecimento
Este trabalho é colectivo, mesmo
quando escrito a solo. E a sua continuidade depende de todos nós.
Índice Final
Parte I – Fundamentos
Jurídicos do Turismo
1. Turismo e Direito: Enquadramento Geral
2.
Fontes
Normativas do Direito do Turismo
3.
Direitos
dos Turistas e Deveres dos Operadores
4. Contratos Turísticos e Regulação Comercial
5. Turismo e Direito Internacional
Parte II – Turismo e Território
6. Turismo e Património Cultural
7. Turismo e Ambiente
8. Turismo e Alojamento Local
9. Turismo e Mobilidade
10. Turismo e Planeamento Estratégico
11. Turismo e Reabilitação Urbana
12. Turismo e Espaço Rural
13.
Turismo,
Urbanismo e Direito do Ordenamento do Território
Parte III – Turismo e
Segurança Jurídica
14. Turismo, Segurança e Direito Público
15. Turismo, Sustentabilidade e Justiça Intergeracional
Parte IV – Turismo e Tecnologia
16.
Turismo,
Inteligência Artificial e Regulação Algorítmica
Parte V – Turismo e Humanidade
17.
Turismo,
Direitos Humanos e Inclusão Global
18.
Turismo,
Inteligência Emocional e Experiência Humana
19. Turismo, Narrativa e Direito Simbólico
20. Turismo, Utopia e Direito Prospectivo
Posfácio: O Direito como
Travessia
Escrever
sobre turismo é escrever sobre o mundo. Sobre os corpos que se deslocam, os
territórios que se transformam e os encontros que nos desafiam. Escrever sobre
o Direito do Turismo é, portanto, mais do que sistematizar normas, cartografar
sentidos, proteger fragilidades e imaginar
futuros.
Este
livro foi uma travessia. Uma travessia por paisagens jurídicas, emocionais,
simbólicas e utópicas. Cada capítulo procurou abrir uma janela para o
território, memória, tecnologia e dignidade. E cada janela revelou que o
turismo é, acima de tudo, uma prática de mundo e que o Direito pode ser o seu
guardião mais sensível.
Não há
turismo sem ética. Não há hospitalidade sem escuta. Não há futuro sem
imaginação. Que esta obra possa servir como convite à reinvenção: da forma como
regulamos, da forma como viajamos, da forma como cuidamos.
Porque
o Direito, quando bem exercido, é também poesia institucional. E o turismo,
quando bem vivido, é também justiça em movimento.
Sinopse Editorial
Turismo, Direito e Transformação é uma obra singular que propõe uma abordagem
interdisciplinar, ética e visionária do Direito do Turismo em Portugal e no
mundo. Estruturada em vinte capítulos temáticos e um epílogo geral fundamental,
a obra percorre os territórios jurídicos do turismo com profundidade e
originalidade desde o ordenamento do território até à inteligência artificial e
desde os direitos humanos até à utopia normativa.
Combinando
rigor académico, sensibilidade filosófica e vocação transformadora, o autor
constrói um modelo jurídico que reconhece o turismo como prática
civilizacional, emocional e simbólica. O livro articula Direito Administrativo,
Ambiental, Internacional, Digital e Cultural, propondo soluções inovadoras para
os desafios contemporâneos da turistificação, da sustentabilidade, da inclusão
e da regulação algorítmica.
Destinada
a juristas, investigadores, profissionais do sector turístico e leitores
interessados na intersecção entre Direito, ética e sociedade, esta obra é mais
do que um tratado é um convite à escuta,
à imaginação e à responsabilidade.
Uma
referência incontornável para quem acredita que o turismo pode ser mais justo,
sensível, habitável e que o Direito pode
ser o mapa que nos leva até lá.
Posfácio
– Direito, Imaginação e o Mundo que Vem
Este
livro termina, mas não se encerra. É uma travessia que continua nas práticas
que inspira, nas perguntas que deixa em aberto e nas vozes que convoca. Ao
longo destas páginas, procurou-se construir um Direito que não apenas regula,
mas escuta; que não apenas protege, mas transforma e que não apenas responde,
mas imagina.
O
turismo, aqui, foi tratado como prática civilizacional , como gesto de
encontro, linguagem de mundo e promessa de futuro. E o Direito foi chamado a
ser mais do que norma e também a ser cuidado, presença e esperança.
Se
esta obra tiver cumprido o seu propósito, então ela terá feito mais do que
informar pois terá tocado. Terá mostrado
que o turismo pode ser justo, sensível e plural. E que o Direito pode ser o
mapa que nos leva até lá.
A
travessia continua. Que outros capítulos sejam escritos. Que outras vozes sejam
ouvidas e que outros mundos sejam possíveis.
Sinopse Editorial
Turismo, Direito e Transformação é uma obra de referência que propõe uma abordagem
inovadora, interdisciplinar e profundamente ética do Direito do Turismo.
Estruturada em vinte capítulos temáticos e um epílogo geral, a obra percorre os
territórios jurídicos do turismo com rigor académico e sensibilidade filosófica
desde o ordenamento do território até à inteligência artificial e desde os
direitos humanos até à utopia normativa.
Combinando
Direito Administrativo, Ambiental, Internacional, Digital e Cultural, o autor
constrói um modelo jurídico que reconhece o turismo como prática
civilizacional, emocional e simbólica. A obra propõe soluções jurídicas para os
desafios contemporâneos da turistificação, da sustentabilidade, da inclusão e
da regulação algorítmica, sem perder de vista a dimensão humana e
transformadora da experiência turística.
Destinada
a juristas, investigadores, profissionais do sector turístico e leitores
interessados na intersecção entre Direito, ética e sociedade, esta obra é mais
do que um tratado; é um convite à escuta, à imaginação e à responsabilidade.
Uma
leitura essencial para quem acredita que o turismo pode ser mais justo, mais
sensível e mais habitável e que o Direito pode ser o instrumento que nos ajuda
a chegar lá.
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